Atualizado em 28/07/2024 as 11:32:01
Com o advento da entrada da humanidade em um novo ciclo, ou nova era, como muitos neo- filósofos profetizaram nesses últimos 50 anos, o planeta sofreu uma drástica ruptura de valores e transformações, no mínimo, radicais.
Com a insatisfação geral da maior parte dos habitantes deste pequeno astro, frente a guerras, adversidades econômicas, religiosas e sociais, as pessoas buscaram novos horizontes. Seja nas artes, no comportamento ou filosofia, um movimento sofisticado e reacionário surgiu nos anos 60 e se alastrou por toda a década de 70.
De um lado, se posicionava o velho e carcomido sistema severo, pseudomoralista, com seus estereótipos furados e pontos de vista que no mínimo nos deram duas guerras mundiais. E de outro, novos videntes revolucionários , que deram uma luz no fim do túnel, apresentando novas vertentes e rumos para a tão defasada e arruinada vida cotidiana deste período.
Começando pelo surgimento do Rock, com Elvis rebolando em frente a milhares de câmeras de TV, altamente censurado na época. Jerry Lee Lewis e sua boca maldita, com seu piano demoníaco jogando merda nos ventiladores do sistema. Aliás, a liberdade foi o tema básico dessas duas décadas (60 e 70). Com a guerra do Vietnã, surge o movimento hippie do “paz e amor”.
Mas não pensem que todos os jovens desta época compartilhavam dos interesses e mudanças coletivas. Havia um foco resistente, o dos “babacas”, que eram sustentados pela pequena burguesia dominante, os boiolas e rebeldes sem causa. Deem uma olhada nos documentários brasileiros dos finais de 60, na época dos grandes festivais com os Mutantes tocando frente a uma plateia recalcada e fria nas suas apresentações na rede Record e Cultura. E ainda, Caetano, Gil, Geraldo Vandré entre outros, sendo exilados do Brasil pelo extremismo inconformado. Ouçam as letras das bandas brasileiras de maior renome como o Terço, Som Nosso de Cada Dia, Tellah, Moto Perpétuo, Terreno Baldio, Casa das Máquinas e irão notar nas entrelinhas a verdadeira base deste tão belo movimento. Belo, por quê? Porque era sem armas, sem guerras estúpidas, sem letras banais. Uma música sofisticada, cabeça, direta e positiva, calcada nos mais puros ideais filosóficos e espiritualistas.
O povão nas ruas estava dividido. Uma parte dos jovens amava os músicos revolucionários, mas outra estava queimando seus discos em praças públicas. Então dizer que tudo foi um “mar de rosas” é pura asneira. Foi luz e escuridão caminhando juntas nesse período conturbado, bizarro e criativo, mas sem dúvida, altamente elevado. O sistema permitiu, meio que “forçado”, que algumas bandas se lançassem na mídia dividida. Algumas ( e creio que a minoria) conseguiu algo durante algum tempo.
Cito : EL&P, Queen, Yes, Genesis, Black Sabbath, Pink Floyd, Stones, Beatles, Kiss, Alice Cooper e Led Zeppelin. De maneira geral estas bandas fizeram grandes eventos e shows, muitos lançamentos com álbuns de prestigio na época, e dominaram de maneira absoluta a empresa do rock.
Ao redor desta ilha de dinossauros e monstros da música, orbitaram as bandas menores, com menos prestigio e poder de penetração. Ainda mais para fora do círculo, estavam a última camada destes heróis, que foram denominados de “underground” hoje denominada a “Arte Cult”.
Nesta camada, acredito eu como um dos músicos segregados do sistema vintage (na época com o Spectro), estiveram talvez os mais expressivos, bizarros, poderosos e estranhos artistas.
Talvez pelo marginalismo, dificuldades, repressão, preconceito e falta de interesse da mídia global, estes pioneiros fizeram uma arte de mão cheia, muitas vezes densa, sofrida, gerada na angústia existencial, somado ainda a dificuldades em se captar recursos e subsídios, dinheiro, produtores e apoio para suas obras.
Neste mundo “underground” o urro se ouvia direto do abismo. A arte fluía com liberdade total das entranhas, pois não havia o que perder. Era tudo ou nada. Não haviam gravadoras controlando, nem mídia se interessando, e a pouca plateia envolvida, era dispersa e condensada.
Focando mais em cima da arte musical (pois o underground se estendia à literatura, dança e artes plásticas também) em especial o Rock, surgiram músicos e bandas fenomenais, que fizeram obras imperdíveis, raras e obtusas, hoje muito procuradas por colecionadores de todo mundo e muito cultuadas pelos sobreviventes “intelectuais” do período vintage clássico.
Passado 45 anos desde 1970, acredito que o “underground” está mais morto que vivo, mas ainda respira e suspira. As cabeças pensantes diminuíram, bem como a filosofia, a metafísica e a criatividade. A música medíocre de massa vigente tem um sistema de “computação e tecnologia” que não tínhamos nos anos 70.
Consequentemente o lixo, a mediocridade, os interesses do capitalismo selvagem em vender a “quantidade” em detrimento da “qualidade” para a massificação e controle do gado humano é hoje “praxis” em 90% do Planeta Terra. O undeground atual com músicos reprimidos, mal divulgados e sem estrutura básica alguma para eventos ou produções, ainda existe e sempre existirá. Talvez esteja em fase de extinção. São os últimos gritos e lamentos de uma raça que está se auto consumindo numa degeneração lastimável, direto para o fundo .
Para completar a matéria, citarei 10 grupos & músicos dos anos 70 que são Underground, uns mais conhecidos, outros nem tanto. Muitos fizeram apenas um disco (LP) e desapareceram no ostracismo. Mas valem ser visitados e apreciados!
1- Cornucopia — Full Horn (Alemanha)
2- Babylon — Same (U.S.A.)
3- Kyeie Eleison –The Fountain Beyond Sunrise (Áustria)
4- Petrus Castrus — Mestre (Portugal)
5- England — Garden Shed (Inglaterra)
6- Moto Perpétuo — Same (Brasil)
7- Locanda Delle Fate — Forse le Lucciole Non Si Amano Piu (Itália)
8- Crack — Si Todo Hiciera Crack (Espanha)
9- Armando Tirelli — El Profeta ( Uruguai)
10- La Máquina de Hacer Pajaros — Same (Argentina)
Texto Publicado na 5ª edição da Revista “Gatos & Alfaces“, Março, 2014
Amyr Cantúsio Jr. – Campinas, SP. Músico, Compositor, Pianista, Produtor e Gestor Cultural, Técnico em Fortran & Cobol, Musicoterapeuta em Neurociencia. Livre Pensador.