Clair de Lune — Capítulo 18

Atualizado em 28/07/2024 as 11:48:07

A viagem é muito difícil, as estradas estavam cheias de buraco e com isso a marcha é lenta, o estado emocional de Jean degrada demais, ele fica o tempo todo olhando para o invisível, não presta atenção no que os amigos dizem, algumas vezes é chamado a atenção para que preste atenção a eles, a ansiedade estava matando ele aos poucos, em sua mente tem apenas a figura de Evelyn, conforme se aproximam de Oxford ele se mostra muito agitado, às vezes deseja descer do caminhão e prosseguir a pé, porém seus amigos não permitem que faça isso.

Finalmente, após dois dias de viagem, chegam à cidade, o amigo de Gregory os deixa numa avenida principal onde se dizia que estava o prédio da Embaixada, enquanto isso ele vai fazer a entrega da mercadoria que carregava, diz a eles que estará de volta naquele ponto no dia seguinte, e caso desejassem voltar com ele que o esperassem ali e todos voltariam juntos.

Jean nem ouviu isso, assim que o caminhão estacionou Jean desce e se encaminha pela rua a fim de buscar o prédio da Embaixada, Gregory o segue logo após combinar o reencontro com o amigo, Charles caminhava ao lado de Jean, de repente encontram dois soldados ingleses e Jean obtém deles a localização do prédio, era seguir adiante cerca de duzentos metros, Jean então corre feito louco em direção à ele, atrás dele vão os amigos.

Assim que chegam ao prédio eles têm a certeza de estarem no local certo, pois havia dois soldados da Polícia do Exército Norte Americano na porta e a bandeira dos Estados Unidos no mastro, então Jean voa até a porta e é barrado pelos dois soldados, Gregory explica a eles o que estavam procurando, então os soldados os encaminham à recepção, ali são atendidos por um atendente, Gregory diz a ele:
— Este meu amigo chama-se Jean, ele é casado com Evelyn que é assistente direta do embaixador Sr. George Folmer que. Inclusive, foi padrinho de casamento dos dois, estamos em busca dela, Jean ficou preso em Paris desde o início da invasão alemã, nós não a vemos desde após o bombardeio de Londres, por favor, precisamos conversar com o Embaixador, nos anuncie, ele vai confirmar a nossa história.

O atendente responde:
— Eu lamento não poder ajudá-los, o Embaixador Sr. George Folmer está nos Estados Unidos e não sei quando ele voltará.

Jean entra em pânico, então diz ao atendente:
— Minha esposa Evelyn era assessora direta do Embaixador, vocês têm que ter alguma informação sobre ela, eu preciso saber o paradeiro dela.

O atendente responde:
— Eu entendo Senhor, porém eu não tenho essas respostas, eu estou apenas trabalhando aqui em regime temporário, sou da área administrativa, aqui só tem pessoal temporário, os funcionários que estavam na Embaixada voltaram para os Estados Unidos, alguns talvez voltem com o Embaixador, mas isso ainda não está certo, o Senhor terá que esperar pela volta do Embaixador, ou então ir até o Consulado que está em Londres.

Gregory agradece ao rapaz e puxa Jean para fora do local, vão à calçada e Gregory fica de frente ao amigo e lhe diz:
— Meu amigo tenha calma, nós só iremos conseguir informações precisas sobre Evelyn após o retorno do Embaixador, mas podemos tentar falar com o Consulado, então vamos voltar para Londres, lá poderemos ter informações, não vamos desanimar.

Jean responde ao amigo:
— Mas como saberemos quando o Embaixador volta?
— Ele terá as nossas respostas, com toda certeza.
— Ele jamais abandonaria Evelyn, e como você mesmo disse as comunicações estão todas confusas e ineficientes, acho melhor um de nós ficar aqui e esperar pelo retorno do Embaixador, os demais voltam para Londres a fim de tentar obter informações junto ao Consulado, assim seremos mais efetivos.

Gregory compreende a colocação do amigo e reponde:
— Eu entendi e acho que você tem razão, essa será a melhor saída, eu me proponho a ficar aqui, assim você vai até o Consulado, e assim que alguém tiver alguma notícia liga para o outro.
— Vamos fazer o seguinte: passamos por um posto da Cruz Vermelha no início desta rua, vamos lá e pegamos o número de telefone deles, eles têm outro posto em Londres que foi instalado muito próximo ao local onde comprávamos os cereais, você deve se lembrar onde era isso, marcamos para nos encontrar nesses postos todos os dias por volta do meio dia, assim quando alguém tiver algo importante a falar liga para esse posto, e pede a quem atender a chamada que anote o recado, assim conseguirmos nos falar.

Assim os dois acertam as coisas dessa forma, então Jean e Charles irão voltar para Londres, enquanto que Gregory ficará em Oxford, seria melhor atuar nessas duas frentes, os três voltam até o ponto de encontro marcado com o amigo de Gregory, passam pela Cruz Vermelha e pegam o número do telefone daquele lugar, conseguem uma refeição simples, mas suficiente para matar a fome que tinham, pegam uns pedaços de madeira e fazem uma fogueira, ali passariam a noite.

No dia seguinte acordam cedo e se dirigem ao ponto de encontro, não demora muito e logo o amigo de Gregory chega Jean e Charles sobre na carroceria e iniciam a viagem de volta para Londres, deixam o amigo em Oxford que os manteriam informados sobre a Embaixada e o Embaixador.

A viagem de volta foi dura para Jean, a angústia pela falta de notícias de sua esposa estava além do suportável, isso reflete no ânimo dele, assim que chegam a Londres vão imediatamente ao Consulado, e as informações são desanimadoras, eles não tinham nenhum informação sobre nenhum funcionário da Embaixada, isso teria que ser feito na própria Embaixada, porém já haviam estado lá e sabiam que nesse local também não tinham informações a serem dadas, ele não tinha o número dos telefones dos pais de Evelyn nos Estados Unidos, ou seja, a alternativa era esperar.

Jean e Charles vão para onde havia o restaurante, e os prédios daquela rua estavam sendo reconstruídos, eles entram no mutirão para auxiliar nessa reconstrução, seria uma ótima atividade enquanto não chegava o meio dia para irem até o posto da Cruz Vermelha e saber se Gregory havia ligado.

Os dias vão passando e não chega nenhuma notícia de Gregory, enquanto isso o prédio vai tomando jeito, a ansiedade de Jean se transforma em depressão, fica calado o tempo todo, olha para a foto de Evelyn com mais constância, quase não come o que obriga ao amigo insistir com ele para que coma alguma coisa, as ruas d Londres vão retomando o aspecto de rua, os prédios vão se formando, e o fim de ano se aproxima, Jean vai até o posto d Cruz Vermelha e manda um recado ao amigo:
— Pelo amor de Deus, me mande notícias.

Após dois dias recebe um recado do amigo:
— O embaixador ainda não retornou dos Estados Unidos, mas há a possibilidade de que ele o faça em janeiro próximo, vamos esperar, o momento chegará.

Isso não melhora o estado de ânimo de Jean, as vezes ele simplesmente senta, fica olhando para o infinito, não move um músculo sequer, fica totalmente inerte, e após algumas horas volta a atividade normal, e assim passa os dias, mas em seu íntimo sente que nunca mais verá a esposa, de que ele a perdeu de sua história.

No dia vinte e cinco de agosto de mil novecentos e quarenta e quatro Jean estava no Posto da Cruz Vermelha, foi buscar notícias de Gregory, de repente ouve-se uma gritaria vinda de outro lado do posto, logo chega a notícia: Paris havia sido libertada do domínio nazista pela Segunda Divisão Blindada Francesa e pela Quarta Divisão de Infantaria dos Estados Unidos!

Imediatamente Jean e Charles se olham, as lágrimas escorrem por suas faces, e os dois se abraçam, sua pátria estava livre.

Em Oxford Gregory volta à Embaixada como o fazia todos os dias, mas naquele dia em especial, dia vinte e um de dezembro de mil novecentos e quarenta e quatro, assim que entra percebe que o recepcionista havia sido trocado, ele se apresenta ao novo recepcionista e relata o que estava fazendo ali, este lhe diz:
— Por acaso você trabalhava num restaurante em Londres?
— De nome Gouter Le Monde?

Gregory fica pasmo, alguém os conhecia e reponde afirmativo à pergunta com um sinal de cabeça, então o recepcionista de identifica:
— Meu nome é Mike, nós nos falamos um pouco antes do início da guerra quando liguei para seu restaurante a fim de marcarmos um jantar para umas pessoas que estavam visitando a Embaixada, foi quando Evelyn conheceu o marido.

Isso deixa Gregory atônito e muito nervoso, então ele fala rápido a ele:
— Jean é o esposo dela, ficou preso em Paris no dia da invasão alemã.

Mike o interrompe:
— Me lembro, o avião teve que levantar vôo antes da hora marcada, o Embaixador ficou arrasado, inconformado com isso, me recordo do olhar de tristeza que assombrou o lindo rosto de Evelyn, fizemos o que foi possível para localizá-lo em Paris sem sucesso algum, os meios de comunicações fora todos interrompidos.

Gregory o interrompe:
— Estamos feitos loucos em busca de Evelyn, Jean conseguiu voltar de Paris faz poucos dias, sabe me dizer onde ela se encontra?

Mike olha com desolação para ele e responde:
— No dia que houve o primeiro bombardeio em Londres eu estava fora da Embaixada a serviço, fiquei fora de lá durante cinco dias, assim que voltei vi que o prédio havia sido todo destruído, recebi informações da guarda local de que teria que me apresentar num posto temporário da Embaixada, ali eu recebi ordens de que deveria voltar aos Estados Unidos imediatamente, e assim o fiz, voltei ontem à noite, estava vendo os documentos e outras coisas que foram resgatadas do prédio da Embaixada em Londres e achei algo que devo lhe entregar, já que Jean não está aqui, abre uma gaveta num armário que estava atrás dele, pega um pequeno pacote e o entrega às mãos de Gregory, este o pega com muito cuidado e abre, vê que dentro dele havia duas fotos do casamento de Evelyn e Jean, um frasco de perfume com metade de seu conteúdo, um pequeno broche que Gregory reconhece ser de Evelyn e a caixinha de música com que Jean havia presenteado ela, ele se choca com o que vê.

Olha para Myke e faz a pergunta que tinha medo:
— Onde está Evelyn?

Myke fica pesaroso e reponde:
— Infelizmente não posso lhe responder a essa pergunta, como te disse antes eu fiquei fora da Embaixada por cinco dias, quando voltei tudo tinha sido destruído, não vi o Embaixador embora eu tenha sabido que ele estava bem, e logo voltei para casa, apenas sei que existe esse pacote porque ele estava arquivado aqui, eu lamento muito em não poder lhe dar mais informações sobre ela, eu trabalhei bastante tempo com ela e é uma pessoa formidável, mas irei tentar obter mais informações, venha constantemente aqui que eu farei o possível para obter mais informações, não vamos perder o contato.

Gregory olha novamente para Myke e o agradece, e faz uma última pergunta:
— Quando o Sr. George Folmer retorna dos Estados Unidos?

Myke responde com firmeza:
— Na primeira semana de janeiro.
— Talvez ele tenha mais respostas para nós, mas só conseguirei falar com ele em sua volta, mas janeiro está logo ai, vamos ter mais um pouco de paciência, embora eu imagine a ansiedade e angústia que vocês devem estar sentindo.

Gregory finalmente se despede dele e toma o rumo da rua, estava morando num abrigo temporário construído pela Cruz Vermelha, enquanto caminha para lá pensa no que fazer com essa informação, ela não ajudava, mas podia piorar, então decide não falar nada para Jean, decididamente o Embaixador teria todas as informações pelo menos essa era a aposta que ele tinha.

O final daquele ano seria dos mais melancólicos para os três amigos, mas o ano seguinte ainda estava vindo e ele poderia trazer boas notícias, ou não.

Walter Possibom, São Paulo, SP é autor de Um Brilho nas Sombras e Quando os Ventos Sopram na Pradaria. É editor dos Blogs Planet Caravan e Walter Possibom Escritor, e além de músico, Livre Pensador.

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