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Cristianismo e Marxismo: Irmãos Gêmeos na Hipocrisia

Atualizado em 04/10/2024 as 00:00:50

Quando faço comparações ideológicas entre Marxismo e Cristianismo, evidenciando as similaridades entre suas éticas, estruturas de pensamento e ideais sociológicos, os esquerdistas, principalmente os moderados, logo admitem que estou certo. É muito comum eles citarem passagens bíblicas em seus discursos para demonstrar o quanto são mais cristãos (empáticos, pacifistas e altruístas) do que a própria direita, comparando em tom de deboche: “eles, que se dizem cristãos, fazem tal coisa, que é anticristã.” Já os direitistas têm uma reação muito diferente, geralmente uma espécie de: “como ousa comparar o Cristianismo, que é a base e a fonte de todas as virtudes do Ocidente, com essa ideologia maligna e satanista que está destruindo o Ocidente?!”

Só gostaria de deixar claro aqui que as bases e o que distingue, de fato, o Ocidente das outras culturas é a cultura grega: a racionalidade acima da fé, a liberdade de expressão e pensamento, e o individualismo. O Cristianismo literalmente roubou e proclamou como seu parte da cultura grega, mesclando-a com a criação da Igreja Apostólica Romana, que no final das contas, retrocedeu os avanços gregos a um modelo muito parecido com as outras culturas da Antiguidade: um coletivismo clerical que se autoproclama representante e servo do “Deus verdadeiro.” Isso serviu de desculpa para dominar e converter à força todas as outras nações que acreditam nos “deuses falsos,” resultando na conversão forçada dos Reinos Germânicos e nos mil anos de trevas que foi a Idade Média.

Ficando claro que o que distingue o Ocidente do Oriente é a racionalidade, o individualismo e a liberdade de expressão e pensamento, e que o Cristianismo, em sua essência, não possui nenhuma dessas três características, vamos refutar os argumentos críticos ao Marxismo, que é o que resta ao direitista tradicional: “mas o Marxismo é um falso altruísmo, porque é a doação e o sacrifício involuntário para ajudar os mais fracos e pobres.” Quando se traz esse argumento, logo se admite que ambas as ideologias são, de fato, altruístas e têm como princípio moral máximo o sacrifício de si mesmo para ajudar ou salvar os mais fracos. Isso é notoriamente simbólico na mitologia cristã, que provavelmente inspirou os socialistas, com Jesus (um Deus) sacrificando a própria vida para salvar a alma de simples e fracos mortais comuns.

É aí que fica evidente, para um observador mais cuidadoso, que não se tratam de ideologias diametricamente opostas, mas de uma competição sobre qual é mais efetiva, ou seja, qual é o verdadeiro altruísmo que devemos seguir (o altruísmo materialista ou o espiritualista)? Já deixo claro aqui que ambos são uma grande merda, de maneiras diferentes. O Marxismo acaba sendo pior, em termos práticos e a curto prazo, exatamente por ser materialista e foder literalmente com a economia e as leis de um país. Mas o Cristianismo acaba sendo a causa do Marxismo, porque ele é o mito fundador que inspira a todos (inclusive os Marxistas) a serem altruístas, com o símbolo máximo de Jesus se sacrificando na cruz. Além, é claro, de toda a mitologia bíblica que traz a ideia de altruísmo, submissão e obediência cega a uma autoridade totalitária, que é Deus (que seria o Estado, na mitologia marxista), e que tem o poder de resolver todos os problemas individuais e coletivos da humanidade. A longo prazo, o Cristianismo cria o Marxismo. É apenas uma questão de tempo. É a aplicação dos ideais cristãos no mundo real político e econômico, sem a projeção do pós-morte (Paraíso, Inferno, Apocalipse, etc.).

Outro ponto fundamental é a estrutura ética de ambos os irmãos. Lembro de uma cena da série “Vikings” em que os padres ingleses começam a dizer que as mortes e as pilhagens das invasões vikings eram um castigo de Deus (durante a peste negra falaram a mesma coisa) por causa da falta de fé e dos pecados em excesso cometidos por eles. Mas isso é apenas um exemplo comum da sociologia cristã, desde a Antiguidade até a Contemporaneidade. Na própria Bíblia, há histórias e mais histórias com a mesma estrutura. Se todos não forem cristãos/socialistas, essa sociedade será um lugar horrível ou terá um destino terrível. Obviamente, um justifica isso espiritualmente e o outro de maneira socioeconômica. Muitos dizem que o Cristianismo é uma religião que defende o individualismo, porque a salvação da alma é algo individual. De fato, isso é um aspecto que cria uma abertura à responsabilidade individual, mas aqui temos uma pegadinha: o critério moral que Deus irá te julgar é de você ser altruísta e submisso a ele o tempo todo. Ou seja, você tem a responsabilidade individual de ser anti-individualista e totalmente submisso. Em outras palavras, no final das contas, o Cristianismo é contra o individualismo e a soberania individual e defende um altruísmo coletivista de obediência cega a uma pessoa: Deus (e de tabela, os líderes e o coletivo formado nas igrejas).

Uma outra evidência da moral coletivista do Cristianismo é que não são apenas os indivíduos os autores do sucesso ou fracasso de uma sociedade, como é na visão de um capitalista individualista, mas temos Deus, o Espírito Santo, o Diabo e as Igrejas. Ouvimos o tempo todo nos discursos americanos: “God bless America.” Entre os cristãos, ouvimos expressões como “família abençoada,” “casal abençoado” e até “nação abençoada” por Deus. Também já ouvi pastores dizendo: “sinto que o Espírito Santo está agindo através de nós, essa Igreja, o corpo de Cristo na Terra.” E é claro, a ideia de que Satanás, o Diabo, está influenciando tal filho que está perdido nas drogas ou o próprio movimento comunista, sempre se presume a invocação do Diabo e relações com o satanismo. Enfim, temos o fator da força sobrenatural que está acima dos indivíduos, já que no final das contas, Jesus irá retornar e fazer justiça, da mesma forma que o fim da História será, de uma maneira ou outra, o Comunismo e o fim do Capitalismo. (E essa é uma das razões da Direita “não fazer nada”; no final das contas, Jesus vai voltar e resolver tudo.) Em outras palavras, há uma inevitabilidade metafísica acima das ações individuais. E não, as similaridades não são pura coincidência; é apenas a verdade nua e crua que ninguém quer ver ou admitir. Até porque, por questões práticas, a Direita não consegue formar seu movimento em nada que não seja uma mistura bizarra de capitalismo e moral cristã, coisas que são contraditórias em si mesmas (e foram inventadas por Ronald Reagan e Margaret Thatcher no contexto da Guerra Fria e falharam no sentido de se manter uma movimento cultural vivo e contínuo na História, mas são repetidas até hoje, sem sucesso). A única moral cristã compatível com o capitalismo é o Calvinismo, que é exatamente a razão dos países de tendência protestante e anticatólica serem os primeiros a se industrializarem e a dominarem a economia mundial: Inglaterra e EUA.

Arte Criada Com IA (Leonardo AI)

A direita mundial, não apenas a brasileira, não consegue formar uma cultura e um movimento global, como a esquerda, por exemplo, porque os fundamentos dela são contraditórios. Cristianismo e individualismo (capitalismo) são como água e fogo. Você junta os dois e ambos se anulam. Ou você faz um malabarismo calvinista e cria uma Teologia maluca como a Teologia da Prosperidade ou um dos dois vai dominar o outro. E na prática, o Cristianismo sempre domina, simplesmente porque ele é moralmente mais apelativo, simbólico e inspirador. O individualismo e o capitalismo acabam virando traços secundários puramente circunstanciais, para se oporem ao projeto socialista político e econômico de agora. Os conservadores cristãos, desde o fim da Idade Média, até pouco antes da Guerra fria, eram TODOS contra o capitalismo e o individualismo, por acreditarem que estes eram ideais anticristãos, materialistas e um produto da modernidade (que destruiu o mundo perfeito que era a Idade Média). Todos queriam retornar de alguma maneira aos ideais medievais. Hoje, a direita faz a mesma coisa. São um movimento que é uma espécie de aberração que não faz o menor sentido. Prega o capitalismo e o individualismo, junto com altruísmo e coletivismo (dinâmicas das Igrejas de todos serem iguais e partes de uma tribo de “abençoados”), querem se revoltar contra o sistema esquerdista, mas ao mesmo tempo são pacifistas, pagam de santos e bons-moços. Portanto, não são capazes de qualquer violência, muito menos pegar em armas, ou algo do tipo, e acabam aceitando a dominação canhota e se preocupando mais com o pós-morte. Se dizem individualistas, mas estão o tempo todo julgando a si mesmos e aos outros segundo uma moral coletiva de padrão único de submissão total a um livro (Bíblia), instituição (Igreja) e a uma pessoa (Deus). Daí tiram sarro quando olham um esquerdista submisso a um livro (Manifesto Comunista ou qualquer merda Woke), uma instituição (partido comunista ou artistas woke) e uma pessoa (que é o ditador comunista ou o presidente Woke, como o Obama, por exemplo). Nunca esse ditado soou tão perfeito aos meus ouvidos: “o pior cego é aquele que não quer ver.”

Olavo Villa Couto, São Paulo. Arquiteto, escritor, e Livre Pensador. Autor de “Satânia” e “Jorro”.

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