Dos Ridículos da Vida — Foros, Fóruns e Um Debate Enviesado


Dos muitos debates, que participei e presenciei, eu vou ressaltar um em particular, pois lá estava eu visitando uma pessoa amiga, em seu local de trabalho. Um local que frequentei várias vezes, uma rádio comunitária católica local, espaço onde ocorreu e ainda ocorre o debate público do lugarejo onde eu vivo, no momento que dedilho este breve texto.

O meu bom amigo, em questão era e é um proeminente geoeconomista, consagrado e muito querido, nos meios acadêmico, econômico e político da região. E lá estávamos nós, na segunda metade do segundo decênio do século XXI, eu e o meu bom amigo radialista e engenheiro de produção (nome chique que se dá aos geoeconomistas). O mestre das ciências geográficas e econômicas, um professor muito querido e pai de um grande amigo meu, um grande e ilustre advogado local. Estamos conversando animadamente na porta de entrada da rádio, ele à espera dos entrevistados.

Eis que chegou o primeiro entrevistado, um proeminente advogado de meia idade, um semideus, um querubim sagrado e consagrado! Aí o papo ficou um pouco mais sério e ficou mais ainda quando chegou o segundo entrevistado, um jovem professor do ensino médio, professor de história e filosofia. Uma conversa amena, mais um papo qualificado, até que chegou por fim, o terceiro entrevistado, um querubim sênior, um empresário e líder da juventude direitista local.

E o semideus e empresário, chegou chegando, sem dizer os tais bons dias e boas tardes, o que é bem comum na cultura que nos envolvia até então, o semideus chegou detonando o Foro de São Paulo, sem dó e piedade. E um pouco de contexto aqui, o Foro de São Paulo é uma entidade obviamente localizada na cidade de São Paulo, entidade que abriga os movimentos sócio-políticos à esquerda da América da América Latina e do Caribe.

Depois do semideus, proferir as tais palavras duras ao Foro de São Paulo, um silêncio se abateu, silêncio quebrado pela minha pessoa, pois lancei duas perguntas fatídicas e ridículas. Ridícula a questão, devido ao alto nível dos querubins semideuses no recinto. Eu um homem negro, periférico, marxista, membro efetivo do aparato repressivo do estado, simplesmente perguntei o que era seria um Foro e qual era a diferença de um fórum. E repeti algumas vezes para ter a certeza que estava pronunciando o meu enunciado com clareza. Caras fechadas de poucos amigos, dos semideuses à parte, não passaram batido o risinho canto de boca, de meu bom amigo engenheiro de produção. E então o advogado semideus, um tanto nervoso, proferiu alguns exemplos de foros e fórum, sem nada acrescentar o debate.

Lá vai eu explicar, para a pequena e qualificada audiência acidental, que os foros são locais de debate e não são deliberativos, são órgãos consultivos, onde as pessoas e entidades debatem. Contudo, não são obrigadas a seguir as determinações e orientações dos debates. Já fóruns são locais onde se debatem e as pessoas e entidades são obrigadas a seguir os resultados dos debates. E lá fui eu explicar que nas democracias capitalistas e ocidental se mantém em duas bases principais, o debate e a escolha. E para os ridículos da vida, desta e de outras possíveis vidas, outro silêncio glacial se abateu na porta de entrada da rádio comunitária e católica. E um adendo aqui, na obviedade que não só nas democracias ocidentais e capitalistas, existem órgãos, oficiais ou não oficiais, de debates e escolhas, foros e fóruns.

Terminada a minha pequena palestra, dei um adeus às armas, para o pequeno bando, eu bati os cascos e fui embora, eu não ficando à espera dos bárbaros e sim esperando que o universo se recompusesse e seguisse o seu caminho.

Fragmento do Livro: “Dos Ridículos da Vida”

Samuel da Costa, contista, poeta e novelista em Itajaí, Santa Catarina.

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