Atualizado em 04/08/2024 as 11:08:50
(Entrevista feita em 2007, por email, para o meu histórico e extinto site A Barata. Não me lembro como cheguei até ele, nem maiores detalhes. BC 12/03/2024)
Gerson Conrad, nome artístico de Gerson Conrradi, um dos fundadores de um dos maiores, senão o maior, fenômeno do Pop e do Rock brasileiros. Músico e arquiteto, Gerson foi integrante do trio básico, juntamente com João Ricardo e Ney Matogrosso, que explodiu as cabeças dos então jovens nos idos de 1973. A banda, de curta e meteórica duração, foi com certeza, o estopim que causou a explosão de muitas bandas desde então. Nesta entrevista, feita por E-Mail em Abril de 2007, Gerson fala com exclusividade A Barata sobre sua carreira solo, seu momento atual e, é claro, sobre o Secos & Molhados, principalmente sobre a polêmica envolvendo o Kiss.
- Barata – Gerson, comecemos a partir do momento atual: o que você tem feito atualmente? Sua atividade é puramente musical, ou exerce outras atividades?
- Gerson Conrad – Sou arquiteto, e divido minhas atividades profissionais, entre a música e a arquitetura.
- Barata – Como vê o panorama do Rock no Brasil e no mundo hoje? O que tem escutado?
- Gerson Conrad – Acredito que a grande novidade ainda está por acontecer. Digo, algo inovador como Beatles e Stones na década de 60 ou mesmo algo criativo como os anos 70 de que me orgulho em ter participado e contribuído. Às vezes tenho a impressão de que as décadas referidas acima estão para os anos vindouros assim como a cultura Grega para até nossos dias. Ou seja, pouca coisa se criou ou inovou desde então, salvo, evidentemente, o avanço científico e tecnológico. Por fim, eu costumo escutar de tudo um pouco.
- Barata – Fale sobre o disco que lançou com a Zezé Motta em 75? Como foi essa experiência?
- Gerson Conrad – Foi uma experiência interessante para a época. Explico, tudo o que eu acreditava naquele momento, era em trabalho de equipe. Me sentia inseguro em gravar sozinho. Hoje não teria tal receio.
- Barata – Em 81 você lançou um trabalho solo que, ao que me parece quase não foi divulgado. Fale sobre esse disco.
- Gerson Conrad – Esse disco gravei pela Continental e sob a direção artística de Moacyr Machado, in memorian. A princípio, me deram total liberdade de produção desde que eu concordasse em trabalhar com o maestro Eduardo Assad (in memorian). Isso me deixou um pouco tenso, uma vez, que a minha concepção para aquele trabalho seria a de trabalhar com o grupo de amigos que me acompanhavam, músicos naturalmente. Tive problemas no sentido da escolha do nome do disco. A primeira opção seria “Rosto Marcado” como foi recém lançado em CD pela Warner. A segunda opção seria “Depois da Sessão de Cinema”. Ambos os títulos permitiriam um trabalho de capa fantástico. Contudo a direção da empresa achou por bem usar de uma foto de arquivo para a contra capa e criaram um cálice quebrado com vinho derramado, imagem ao meu ver negativa, e com um agravante só com as iniciais do meu nome “Gerson Conrad” o que dificultava a identificação nas prateleiras. Porém, o disco musicalmente, é lindo.
- Barata – Como você se vê como músico e como artista de uma forma geral, hoje? Que estilo pretende?
- Gerson Conrad – Bem, como tudo na vida tem uma evolução natural, naturalmente, eu me sinto mais maduro aos meus 55 anos de idade como músico, como artista ou como você diz, de forma geral. O que procuro oferecer em minhas performances é um trabalho profissional em seu todo. Naturalmente me vejo enquadrado dentro do conceito “Rock”.
- Barata – Você musicou um poema de Vinicius de Moraes, “Rosa de Hiroshiima”, que foi uma das mais tocadas do Secos & Molhados. Como foi essa experiência criativa. Sabe da reação de Vinicius á composição?
- Gerson Conrad – Esse poema de Vinícius estava perdido em uma antologia poética sobre suas obras segundo o próprio poeta. Me foi apresentado por João Ricardo. Como tratava de um contexto universal, me encantei e compus a melodia. Quando tivemos a oportunidade de mostrar como havia vestido o seu poema, Vinícius me agradeceu e se emocionou muito.
- Barata – Falando sobre letras, as letras dos Secos & Molhados eram muito boas, poéticas. Mas não podemos esquecer que estávamos numa época de Ditadura Militar ferrenha no Brasil e que a maioria dos artistas buscava, de alguma forma, combater essa ditadura. A banda essa preocupação, digamos, política? Qual era a sua postura com relação à Ditadura, na época?
- Gerson Conrad – O grupo tinha uma postura politizada não partidária. Viver aquele período de repreensão e repressão não era das melhores experiências evidentemente. Acredito que contribuímos com a nossa criatividade para colorir um pouco mais aqueles dias militarescos. Eu particularmente era um universitário naquele momento como tantos outros.
- Barata – O fenômeno “Secos & Molhados”, da forma e no momento em que aconteceu, mexeu com muita coisa e com muita gente. As roupas, danças, a poesia das letras, enfim, foi uma autêntica Revolução. Como era sua cabeça antes e depois dele?
- Gerson Conrad – Não só eu, mas meus dois companheiros éramos muito conscientes. Nada do que criamos ou fizemos foi ao acaso. O que não podíamos contar era com o sucesso e o que isso contribuiria ou não posteriormente. Minha cabeça era e continuou sendo equilibrada.
- Barata – Como era seu relacionamento com o Ney Matogrosso e com o João Ricardo? Li algumas entrevistas suas que contava que o relacionamento de vocês não era lá essas coisas. Como era isso?
- Gerson Conrad – Durante o tempo em que tivemos juntos considero que tenha sido um relacionamento normal. Naturalmente que divergíamos em muitas coisas. Com Ney, mantenho até hoje um relacionamento cordial. Já com João a cordialidade está diretamente ligado ao respeito ou não pela minha pessoa. Se ele me respeita a recíproca é verdadeira, se não…
- Barata – Secos & Molhados com certeza rendeu muita grana. Vocês ficaram ricos com o Secos & Molhados? (Risos)
- Gerson Conrad – Não. Teríamos ficado se o grupo não tivesse acabado.
- Barata – Como aconteceu a formação da banda e de quem foi a idéia do conceito geral, roupas, letras, essas coisas?
- Gerson Conrad – Foi a partir de um convite do João Ricardo. Começamos despretensiosamente a ensaiar a ideia hora em seu casa ora na minha, pois éramos vizinhos de mesma rua.
- Barata – Na capa do primeiro disco, tinha a foto de Marcelo Frias. O que aconteceu com ele, pois ao que consta, logo nos primeiros shows ele já não aparecia?
- Gerson Conrad – Marcelo teve a chance assim como os demais músicos de participarem ativamente do grupo Secos & Molhados. Porém ele optou por sair antes mesmo de o disco chegar às lojas. Sei que há muito ele vive em Florianópolis, S.C.
- Barata – A banda de apoio tinha músicos de primeira linha, como o Willy Werdaguer e o John Flavin. Nos shows, a banda era a mesma?
- Gerson Conrad – Sim, a banda era a mesma que gravou conosco. excelentes músicos!
- Barata – “… e fomos vítimas de sacanagens das multinacionais, com propostas nunca concretizadas.” Essa frase é sua, não? Consta no Wikipédia… O que exatamente aconteceu?
- Gerson Conrad – Sim, e fomos mesmo. Explico, Roberto Carlos era naquele momento o maior vendedor de discos em território nacional com cerca de cinquenta mil cópias ano. Aí, aparecemos nós e revolucionamos o mercado com números superiores a um milhão de cópias. Então as multinacionais que precisavam da matéria prima para a confecção dos seus discos nos fizeram propostas individuais que jamais se concretizaram com o intuito de minar o grupo. Pois vivíamos uma crise de petróleo matéria prima para a confecção dos discos da época.
- Barata – Falando em frases: “O que o Ney fez de importante, foi nos Secos & Molhados. O Gerson é medíocre, músico de uma composição só.” Essa frase é atribuída ao João Ricardo sobre sua pessoa. O que tem a falar sobre isso?
- Gerson Conrad – João é pobre de espírito. Não reconhece o talento de Ney e não perdoa o fato de minha composição, Rosa de Hiroshima, ter feito mais sucesso do que as suas tantas composições. Costumo dizer que João confundiu a máxima literária que diz: “Não importa a intenção do autor o que importa é a obra.”, e sendo assim, ele acredita ser a própria obra. Chega a ser patético.
- Barata – Essa troca de farpas entre os antigos membros do Secos & Molhados, impossibilitaria um retorno do conjunto atualmente? Mesmo com muita grana na jogada? Aliás, o que pensa sobre o retorno de bandas extintas apenas por grana?
- Gerson Conrad – Acredito que essas bandas que retornam acabam por dar a seu público e fãs um precioso presente. Não importa se voltam por grana ou não.
- Barata – Com relação á antiga polêmica sobre o Kiss ser uma cópia do Secos & Molhados, o que há de verdade nisso? A história do empresário americano, essas coisas. Gene Simmons e a galera ligada ao Kiss simplesmente ignora ou afirma que é apenas coincidência. Particularmente lembro de uma matéria publicada, se não me engano em 74, na Folha de São Paulo sobre isso. Mete a boca sobre isso.
- Gerson Conrad – O fato é que estávamos no México e dois empresários americanos foram ao nosso encontro para tratar de nossa entrada nos EE.UU. Ao final da reunião disseram que assim como haviam criado “The American Beatles” criariam também um grupo à nossa imagem. Coincidência ou não, o KISS nasceu depois desse advento.
- Barata – Escutei falar que você tem um livro pronto falando sobre você e sobre o S&M. Esse livro existe? Quando sai?
- Gerson Conrad – Trata-se de um depoimento que escrevi com o intuito de catástase sobre tantas especulações sobre o extinto grupo. Até agora não consegui uma editora que topasse o projeto.
- Barata – Bem, pra encerrar e agradecendo imensamente a entrevista, se tem alguma coisa que esqueci de perguntar e que você quer falar, manda bala. Aqui ninguém tem rabo preso com ninguém e o nosso lema “Liberdade de Expressão e Expressão de Liberdade” está a sua disposição. “Fala”.
- Gerson Conrad – É sempre um prazer ser lembrado!”
10/04/2007
Barata Cichetto, Araraquara – SP, é o Criador e Editor do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador.