Atualizado em 22/07/2024 as 20:28:32
Pierre Mayrant
Traduzido por Rafael Salvi
La Nef
31/05/2024 11:32
A aquisição do Twitter (agora X) por Elon Musk despertou os fantasmas da embriaguez tecnófila que experimentamos de forma hipertrofiada durante a década de 2010 e que pareciam ter morrido desde a crise da Covid-19. O imprevisível empresário tornou-se, assim como Bill Gates, Steve Jobs e Mark Zuckerberg em sua época, o emblema de uma parcela da sociedade que sonha com um futuro transhumanista. Uma oposição está se formando contra eles.
A crítica à tecnologia tem uma herança de séculos e acabou por formar um corpo substancial de pensamento filosófico. Esse “tecnocriticismo”(1) nasceu no final do século XVIII, no início da revolução industrial na Europa, como uma reação a uma realidade técnica que estava começando a se tornar visível por sua amplitude. As invenções ainda apareciam isoladas, mas a produção em linha de montagem, o desenvolvimento de fábricas e a multiplicação de tecnologias iriam em um curto espaço de tempo alterar consideravelmente as paisagens e a temporalidade por meio da redução das distâncias.
Essa ruptura espaço-temporal deu origem a grandes esperanças e aumentou as crenças modernas no progresso indefinido, que se tornou o discurso dominante do século XIX. Os autores mais proeminentes se deixaram seduzir, como Victor Hugo, Théophile Gautier e, depois de muita resistência, Émile Zola. Outros eram céticos, como Charles Baudelaire: em uma crítica à Exposição Universal de 1855 que combinava fascínio e desaprovação, o poeta falou da tecnologia como uma “lanterna moderna” que “lança escuridão sobre todos os objetos de conhecimento”(2). Embora todos elogiem esse progresso como o acelerador de uma vida confortável, ele prefere as palavras “decrepitude” e “decadência”. Ele foi o primeiro a enfatizar a dimensão religiosa desse novo fascínio, porque “as coisas de ordem material e as de ordem espiritual” estavam, em sua opinião, “estranhamente misturadas”.
Se Charles Baudelaire parece ter aberto caminho para o questionamento da fé no progresso no século XIX, ele não foi o primeiro a se revoltar contra a tecnologia, pois muitos artesãos e trabalhadores já o haviam precedido. Esses últimos se revoltaram contra o perigo das máquinas, que os forçavam a desgastar seus corpos em gestos repetitivos e sem nenhum domínio do ofício. Eles estavam condenados a reaprender constantemente os rudimentos de uma máquina nova e mais moderna, que acabaria por substituí-los. A revolta ludita de 1811-1812 foi justamente uma reação dos artesãos ingleses contra os empregadores e fabricantes que estavam promovendo o uso de máquinas no trabalho com a lã e o algodão.