Atualizado em 13/06/2024 as 09:26:42
SINOPSE:
São 100 contos escritos entre 1999 e 2021, selecionados pelo autor, com temas distintos como sexo, política, Rock. O autor tem seu forte na poesia, tendo publicado 15 livros no gênero, e nos contos deste livro, esmera-se na literatura em prosa, tratando com muita humanidade todos os seus personagens. Quase todos os contos são inéditos, não tendo sido sequer publicados na Internet.
AVALIAÇÃO
Genecy Souza
Como se deve ler um livro que reúne contos com as mais variadas estórias (ou histórias)? Resposta: pelo conto que dá título ao livro. Simples assim.
Em seguida, os demais contos devem ser escolhidos aleatoriamente. É mais divertido, além de dar a noção de tornar o livro mais extenso do que parece, ainda que seja no formato de bolso e com menos de 100 páginas.
No caso de O Homem Que Fotografava Sonhos e Outros 99 Contos, é o que sugiro fazer. As mais de 450 páginas impressas em fonte de tamanho compacto conferem ao mais recente lançamento de Barata Cichetto o aspecto de livrão. Na verdade, o autor é um fotógrafo do lado B das pessoas há pelo menos três décadas.
O melhor de tudo é que Barata fotografa não apenas pessoas anônimas, reais e fictícias, bem como a si próprio de frente para o espelho, sem medo de expor-se, ainda que dê a si um pseudônimo — ou se apresente como um anônimo. Na verdade, isso pouco importa. Quem segue a saga do autor já conhece seu modus operandi.
Obviamente, iniciei a leitura a partir da página 195, local do conto que dá título ao livro. Guido Flores, um menino sobrevivente de uma poliomielite nascido no final da década de 50, desde cedo cultivava duas paixões – ou manias: sexo e fotografia. Seu alvo era apenas um: mulheres. Curioso, o garoto descobre, dentro de um guarda-roupa, uma caixa contendo uma velha garrucha e fotografias que mostravam mulheres nuas.
Surpreendido pelo pai, foi duramente castigado com uma violenta surra. Pouco tempo depois desse incidente, Guido encontrou uma antiga máquina fotográfica. Daí em diante, após um processo de metamorfose, o garoto curioso se transformará em um fotógrafo muito famoso. O resto do conto eu não conto.
O Conto – talvez escolhido a esmo por causa do título – não promete ser o melhor, e muito menos o pior dessa compilação –, já deixa claro ao leitor que o autor não vai deixar barato (sem trocadinho) suas visões de mundo e das pessoas, sem a menor preocupação de aplicar uma camada de verniz de maneira a amenizar as vidas áridas, feias e duras, relatadas com toques de crueldade e humor negro. Apesar disso, e olhando com cuidado, é possível encontrar alguns toques de compaixão – ou será amor? – como em A Cuidadora, onde uma mulher de 30 anos já em seu terceiro e infeliz casamento, é contratada para trabalhar como cuidadora de um rico idoso de 91 anos. O velho é um tipinho arrogante e lascivo, chefe de uma família rude vai se abrindo para sua contratada, expondo todo um rol de mentiras que permeiam sua vida desde sempre. O desfecho dessa história também não vou contar. Contudo, o que se presume é que uma flor também pode nascer em meio ao lixo.
Dos dois contos citados restam ao leitor outros noventa e oito. Neles, há todas as formas de análise da natureza humana. Mesmo tendo mulheres como eixo, o livro apresenta um forte senso crítico que acaba abrangendo também a política, a religião, a música e tudo o mais que o gênio humano cria, desfigura e até mata.
Nada se se perde em O Homem Que Fotografava Sonhos. Tal qual um fotógrafo experiente como Guy Lomanco, Barata Cichetto ajusta suas lentes e as aponta para seus alvos, todos seres humanos, em preto e branco granulado, com luz difusa ou sob o sol forte, o que vale são seus cliques no lado B do ser humano. É assim que ele se apresenta no seu íntimo. Ou não?
O Homem Que Fotografava Sonhos e Outros 99 Contos
Barata Cichetto
Contos
UICLAP, 2021
456 Páginas
16 × 23 × 2,38 cm