Atualizado em 15/08/2024 as 22:43:43
Quando se fala em bandas brasileiras de rock, os nomes que vem à mente são os de sempre: Legião Urbana, Titãs, Paralamas do Sucesso, Engenheiros do Hawaii, Ira!, Capital Inicial, Barão Vermelho, Blitz, Plebe Rude, RPM, e ‘trocentas’ outras, todas surgidas na década de 1980, dando a entender que nada havia do agora rock and roll velho de guerra. O mais perto a que se chega é a Jovem Guarda, tendo Roberto Carlos como expoente máximo do movimento surgido nos anos 1960. Outros nomes lembrados são Os Mutantes, também surgidos na década do desbunde. Vale citar também o movimento da Tropicália, mas isso é assunto para outra conversa.
Entretanto, e ao que parece, nesta época de informação plena desconfio que há manés que ainda não se dão conta, seja por preguiça, comodismo — e até mesmo desinteresse – de saber que o rock pôs os pés no Brasil lá no final da década de 1950, quando Nora Ney, uma cantora de sambas-canção, gravou um cover (em inglês mesmo) de Rock Around the Clock, megassucesso da banda norte-americana (estadunidense é o caralho!) Bill Haley & His Comets, que, após incendiar a cabeça da juventude nos EUA, contaminou todo o Ocidente.
Pois é. O rock já é um vovô de 70 anos que, no entanto, continua jovem, dependendo do entendimento de quem o aprecia como o ritmo que fez/faz balançar vidas e modos de pensar. Desde o pueril rock de Bill Haley até ao movimento largamente segmentado nestes tempos de música fácil e gratuita. Nessas sete décadas o rock fez acontecer, sendo a voz da geração pós-Segunda Guerra Mundial. Foi uma revolução. E, claro, o rock errou. E errou feio diversas vezes.
Conforme já dito por especialistas respeitados, o rock brasileiro nunca conseguiu ter o alcance de outros gêneros musicais. Ele sempre foi um segmento à parte de todo o resto. O boom do rock ocorrido nos anos 1980 foi uma conjunção de fatores que acabaram dando grande destaque às bandas citadas no início desta matéria. Todo mundo ganhou dinheiro. Passada a febre do tal BRock, as bandas que ainda teimam em existir ganharam um viés passadista. Não há demérito nisso. É bom saber que o Camisa de Vênus ainda faz o maior som, enquanto outras estão mais para aquela coisa de baile da saudade. A ordem é sobreviver.
À parte todo o contexto acima referido, uma outra vertente do rock brasileiro viveu de certa forma, digamos, marginal. Essas bandas sentiram na pele o peso de não serem as queridinhas da mídia. Essa turma fazia música de maneira praticamente subversiva, com a cara, a coragem e os bolsos vazios. E não me refiro apenas às questões políticas, mas também ao mercado e a mídia. Nessas, a pecha de roqueiro com cara de bandido grudou como tatuagem. E é aí que dá para situar uma das maiores bandas de rock brasileiras: a Patrulha do Espaço, que faz por merecer mais um livro sobre sua trajetória. Na verdade, é a terceira edição revisada e ampliada do mesmo livro de autoria de Luiz Carlos Barata Cichetto, lançado pela Editora UICLAP. As duas primeiras edições foram feitas no velho estilo DIY (do it yourself/faça você mesmo), estando esgotadas há vários anos.
Não pense, caro leitor, que o livro Patrulha do Espaço no Planeta Rock se trata de uma biografia — pois ele não é —, uma vez que o autor nunca teve essa intenção. Dado isso, não há como saber como foi a infância dos integrantes, a começar pela do seu comandante máximo Rolando Castello Júnior – o Júnior, como Barata Cichetto costuma se referir ao comandante –, cujo nome está eternizado na lista dos maiores bateristas do rock brasileiro. E não é pouca merda.
A Patrulha do Espaço foi fundada no ano punk e da discothèque de 1977, pelo ex-Mutantes Arnaldo Baptista, já desembarcado da folia irreverente/colorida/galhofeira da Tropicália, e já vivendo em outra vibe, pois, àquela altura, o ‘ex’ de Rita Lee estava metido em uma crise existencial que evoluiu até aquela tentativa de voo solo, na virada de 1981 para 1982 que quase o matou. Arnaldo deixou a banda em 1978, cabendo, a partir daí, a liderança de Rolando Castello Júnior, o qual viveu os altos e baixos da Patrulha do Espaço até os dias que correm.
Como “Patrulha do Espaço no Planeta Rock” não se trata propriamente de uma biografia, Barata Cichetto faz uso do seu período como manager e faz-tudo da banda, quando esta caiu na estrada a bordo de um velho ônibus Mercedes-Benz apelidado de Azulão, percorrendo milhares de quilômetros pelo Sul e Sudeste, entre os anos de 2001 e 2004 com a banda a bordo. Como não poderia deixar de ser, viver uma vida on the road implica em aceitar sacrifícios e enfrentar desafios. Em se tratando de Brasil, bem como pelo fato de a Patrulha não ser nenhuma Rolling Stones (em termos de grana e glamour, entenda-se), a convivência entre uma cidade e outra exige, até onde é possível, uma convivência pacífica. Barata Cichetto sintetiza as aventuras rodoviárias nos diários de bordo muito bem expostos no livro. Obviamente, os desgastes ocorrem, acentuados pelo conforto espartano do Azulão. Entretanto, pelo que o livro indica, o período representa muito bem o jeito rock and roll de ser.
Ao contrário das edições anteriores, esta terceira de certa forma recompensa o leitor pela longa espera, apresentando uma diagramação contendo os balões inspirados em uma HQ. Como se isso não bastasse, o livro está ricamente ilustrado com fotos das capas dos álbuns, tickets e outras informações que não deixarão o Patrulheiro veterano, tampouco o de primeira viagem, sem o devido amparo informativo adicional. Não há como se perder.
De certa maneira – e com justiça – o livro acaba sendo, também, um tributo aos ex-integrantes da banda, sobretudo aos que já não estão entre nós. Cabe acrescentar ainda, que a Patrulha do Espaço segue resistindo à prova do tempo e dos modismos e, por incrível que pareça, vivendo na mesma marginalidade de sempre.
Por fim, tal como diz Neil Young: Rock and Roll is Here to Stay.
Genecy Souza, de Manaus, AM, é Livre Pensador.
Possui textos publicados na revista digital PI Ao Quadrado e na revista impressa Gatos & Alfaces.
Patrulha do Espaço no Planeta Rock
(3ª Edição)
Barata Cichetto
Crônicas/Artigos
UICLAP, 2024
196 Páginas
16 X 23 X 1,25 cm
[…] Leia a Resenha Por Genecy Souza […]