Atualizado em 04/08/2024 as 00:00:22
Artistas fracassados, ao menos do ponto de vista do sucesso financeiro e social, tendem a querer se consolar, dizendo que o que escrevem e publicam não é para seu próprio usufruto, que fazem isso apenas por si… E por seu legado…
Antes de mais nada, deixe-me falar sobre meus conceitos sobre fracasso e sucesso:
Fracasso e sucesso são conceitos que, ao longo da minha vida, ganharam significados profundos e pessoais.
Para mim, fracasso é a ausência de alcançar os objetivos que desejei ou esperei. É aquela sensação amarga de não atingir as metas que estabeleci. Já vivi isso de diversas formas: projetos que não deram certo, sonhos que não se concretizaram, momentos de desânimo. O fracasso é doloroso e muitas vezes traz sentimentos de decepção e frustração. Ele pode abalar minha autoestima e confiança, fazendo-me questionar meu valor e minhas capacidades. No entanto, aprendi que o fracasso também pode ser um poderoso professor. Cada falha carrega lições valiosas que, se eu estiver disposto a aprender, podem me guiar para um caminho de crescimento e resiliência.
Sucesso, por outro lado, é a realização dos meus objetivos, é a sensação de dever cumprido e a alegria de ver meus esforços recompensados. Quando penso em sucesso, penso em momentos de orgulho e satisfação, em metas alcançadas e sonhos realizados. Sucesso aumenta minha autoestima e confiança, abrindo portas para novas oportunidades e desafios. É celebrado não apenas por mim, mas também por aqueles ao meu redor, trazendo reconhecimento e elogios. Mas o sucesso não é apenas sobre riqueza ou fama; é sobre alcançar uma sensação de realização e bem-estar, sentir que estou no caminho certo.
O interessante é que fracasso e sucesso estão interconectados na minha jornada. Muitas vezes, o fracasso foi um precursor do sucesso. Aprender com as minhas falhas anteriores tem sido fundamental para alcançar objetivos maiores. O que para mim pode parecer um fracasso, para outro pode ser um passo necessário no caminho para o sucesso. E vice-versa.
Como artista, essa dualidade é ainda mais evidente. Muitas vezes, a hipocrisia reside na negação do meu desejo de sucesso e reconhecimento. Eu posso dizer que crio apenas para mim, mas lá no fundo, anseio por validação externa, por ver minhas obras apreciadas e reconhecidas. O fracasso, nesse contexto, pode parecer uma falta de validação, enquanto o verdadeiro sucesso é subjetivo e íntimo.
Estou constantemente enfrentando o dilema entre permanecer fiel à minha visão artística (autenticidade) e alcançar o sucesso comercial (reconhecimento). É uma luta contínua para equilibrar esses dois aspectos e encontrar um caminho que me satisfaça tanto artisticamente quanto pessoalmente.
Fracasso e sucesso são duas faces da minha jornada, frequentemente entrelaçadas no caminho do meu crescimento pessoal e profissional. Cada um tem seu papel, sua importância, e juntos, eles moldam quem eu sou e quem estou me tornando.
Agora, esclarecendo o sentido de duas palavras que serão as chaves deste texto: “legado” e “hipocrisia”. O que uma coisa, que parece tão distante da outra, tem a ver? Analisemos:
Segundo o dicionário, “legado” é um termo que se refere ao conjunto de bens, valores, conhecimentos, tradições e influências que uma pessoa ou grupo de pessoas deixa para as gerações futuras. Esse termo pode ser utilizado em vários contextos, incluindo: Herdeiro: O patrimônio ou propriedades físicas que uma pessoa deixa para seus descendentes ou outras pessoas após sua morte. Cultural: Tradições, crenças e práticas culturais que são passadas de uma geração para outra. Intelectual e Artístico: Obras, ideias, descobertas e criações artísticas ou científicas que continuam a influenciar e inspirar futuras gerações. Social e Moral: Valores, princípios éticos e morais que uma pessoa ou grupo inculca na sociedade, influenciando o comportamento e as normas sociais. Em suma, o conceito de legado destaca a importância de deixar algo duradouro e significativo que continue a impactar o mundo após a passagem de uma pessoa ou grupo.
E… A hipocrisia? Hipocrisia é o ato de fingir ter crenças, virtudes, sentimentos, padrões ou qualidades que uma pessoa na verdade não possui. É um comportamento dissimulado, onde as ações de uma pessoa contradizem o que ela afirma acreditar ou defender. Em outras palavras, é a prática de mostrar uma aparência de moralidade, religiosidade ou qualquer outra virtude, enquanto na realidade, suas ações demonstram o contrário. O hipócrita fala uma coisa, mas faz outra. Por exemplo, alguém que prega honestidade, mas frequentemente mente ou engana os outros. A hipocrisia envolve a manutenção de uma fachada ou aparência de virtude ou moralidade para enganar ou manipular os outros. Muitas vezes, a hipocrisia é motivada pelo desejo de obter algum tipo de vantagem pessoal, seja ela social, financeira ou de outra natureza. Hipócritas frequentemente condenam nos outros comportamentos ou atitudes que eles próprios praticam. Resumidamente, a hipocrisia é geralmente vista de forma negativa, pois envolve desonestidade e manipulação, prejudicando a confiança e a integridade nas relações sociais.
E se juntarmos as duas coisas, no que dá? Primeiramente, a hipocrisia é a primeira coisa que me vem à mente: não diga, caro artista, seja de que área for, da pintura, do cinema, da literatura, de qualquer que seja, que:
Escreves apenas para você, porque essa é a mais pura confissão de hipocrisia, pois, a não ser em diários íntimos, qualquer pessoa que escreve um conto, um livro, uma poesia; ou pinta uma tela, faz um filme, desenha… Enfim, não quer que apenas seja visto e lido por si mesmo, as páginas do seu caderno, o leitor do seu computador ou celular… Ou as paredes da gaveta. Não, caro hipócrita, isso é uma mentira que conta a si mesmo, tentando disfarçar sua tristeza de não ter seus trabalhos vistos, lidos e principalmente comprados, por ninguém além de si mesmo e mais uns dois ou três amigos. Todo artista, mais que qualquer outro ser na face da Terra, é vaidoso, e mais até que vaidade, quer ser enxergado. Quando colocamos ao público o resultado de nossos pensamentos, ideias e sentimentos, queremos, sim, que admirem, concordem, gostem, discordem, xinguem, discutam… Mas, que nos percebam. Não fosse isso, qual a razão da existência das redes sociais, que, aliás, causaram um exponencial aumento do número de poetas e escritores como nunca antes visto na história da humanidade? Então, caro artista, jamais diga que expõe sua arte… Per si.
O legado… Bem, parece nome de filme… Imagino que o prezado, ou a prezada, artista tenha uma obra que renda algum dinheiro. Penso que talvez tenha filhos ou filhas, ou netos e netas. Bem, pensar que deixará algum trocado a eles é justo e nobre. Mas, apenas suponhamos que o generoso artista, seja por hora e quem sabe até quando, um total e completo desconhecido, que até paga para publicar ou expor seus trabalhos, pelos quais seus descendentes, que em nada contribuíram – nada, absolutamente nada, porque a criação intelectual de um ser humano depende apenas de si – possam, em primeiro lugar, caso um dia depois que suas carnes sejam comidas pelos vermes ou chamas, ter direito a:
2.1. Por setenta anos depois de sua morte, caso sua obra valha algo, receber os lucros.
2.2. Decidir se sua obra pode ou não ser publicada, vista, ou mesmo retificada, mesmo que você jamais admitiria. (Como exemplo: a bisneta de Monteiro Lobato autorizando “revisões” de textos que ela sequer possivelmente estava viva para ter conhecimento do contexto da época que seu bisavô viveu).
Dentro deste item, imagine que seus filhos e demais descendentes nunca tenham lido, visto ou ouvido qualquer uma de suas obras, e que discordem e tenham vergonha do que você faz. E que podem, por direito legal, mandar expurgar tudo que foi feito pelo uso exclusivo de sua mente, única de seu indivíduo, sua dor, sua criatividade e eventual genialidade, de todas as redes, sociais ou não. Deletar seus arquivos de computador. Queimar seus impressos e assim procurar apagar sua existência artística do mundo, não apenas real, como do virtual.
Depois dessas duas análises paralelas, o que temos? Temos a tal e porca realidade. Como? É… A realidade suja e verdadeira que diz:
1. Procure, sim, ser lido, visto, comentado e especialmente comprado (sua obra, não você), sem vitimismos e desculpas.
2. Não venda sua alma ao lucro, mas não deixe de pensar que sua arte é seu trabalho, e como qualquer trabalho, merece ser recompensado e pago regiamente.
3. Não espere nada de ninguém, ou seja, não acredite em promessa de influencers, editoras, coaches, etc. Eles querem apenas o seu dinheiro, nada mais.
4. Não seja vitimista, não creia na conversa fiada, especialmente dos dogmáticos de esquerda, que irão lhe dizer que se você não é um sucesso, não ganha dinheiro, não está rico com sua arte, a culpa não é sua, mas dos outros. Culpas, como os infernos, não são os outros.
5. Editoras não são mães, redes sociais não são pais. Não acredite no que lhe parece fácil e barato: “Follow the money”.
6. Sua mãe, sua esposa, seu marido, sua gata ou seu cachorro acham que você é o melhor do mundo como artista? Desconfie. Todos eles mentem. Aquele seu diabinho do ego sopra na sua orelha que você é o melhor, apenas injustiçado? Não ouça… Primeiro porque diabos não existem.
7. Pense no que é ter sucesso: ter dinheiro e uma mansão, viajar o mundo? Comer ou dar para as mulheres ou homens mais maravilhosos do mundo? Ter carros de luxo, uma Alexa em cada quarto?
8. Tenha em mente que tudo aquilo que você vê sobre o sucesso de artistas no cinema, na literatura e na televisão são apenas golpes para que acredite que você, sendo um ferrado ou uma fodida, no mau sentido, trabalhe como um cão ou uma cadela e morra à míngua, deixando o lucro para… Releia a parte sobre herdeiros.
9. Não acredite em maldição, na balela de “artista maldito”, e muito menos em carma, que artistas bons, aqueles que depois foram considerados gênios, morreram na miséria, como Van Gogh, Kafka e outros. Não ache que você é um gênio e que cem anos depois de sua morte será glorificado. A genialidade, neste mundo de verdade, depende de conceitos que dependem mais do preço do que do valor que cada obra ou artista tem.
10. Finalmente, admita que se não conseguiu estar na lista dos escritores, poetas, pintores, etc., é porque algo ou alguma coisa deixou de fazer, seja correta à sua consciência, à sua audiência, ou qualquer outro motivo. Se é por sua consciência, de acreditar que não se vender, pode ser um perder, mas mesmo assim continuou no caminho da retidão, muito melhor. Se acredita que está tudo certo com seus valores e mesmo assim não ganhou fama, dinheiro e sexo, não há problema algum. Agora, se acha que a culpa é do Sistema, reveja seus valores: a culpa nunca é deles por seus fracassos, é sempre sua. — Se não entendeu, retorne ao item sobre vitimismo.
Aprendi uma lição, há muitos anos, por uma simples frase de um cineasta espanhol, Fernando Trueba (Interessante que que tenho certeza de ter lido uma frase com esse conceito do diretor há coisa de uns dez anos, em 2012 ou 13, porque ela muito me marcou, mas agora, ao procurar a fonte na Internet não encontro. Será que sonhei, ou… Deixa para lá…), esplêndido diretor, mas pouco conhecido nos meios cinematográficos, que disse algo assim: sucesso é ir e fazer, se você teve uma ideia, um projeto e o realizou, expôs ao mundo, sim, você é um sucesso. Se ganhou dinheiro ou fama com isso, é outra questão.
E eu digo, para encerrar: Eu sou sucesso! E…?
28/07/2024
Barata Cichetto, Araraquara – SP, é Criador do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador.
Barata mais uma vez mostra-se direto e certeiro em suas “chineladas”!