Imagem Por IA - Leonardo AI

O Fêmur Tecnológico de Renato Pittas

Conheço Renato Pittas há quase 15 anos. Foi na época em que comecei a fazer uma webradio, com meus programas de Rock e Poesia. Na lista de produtores, havia um nome: Sara Evil. Eu, na época solteiro, logo me interessei. Mas essa figura parecia ser arredia, o que me atiçava ainda mais. Um dia, em um programa, resolvi agradecer a acolhida e mencionei fulano, beltrano, sicrano e… “a” Sara Evil. No chat da rádio, minha gafe foi geral, porque eu não sabia que Sara Evil era um homem… o Renato Pittas, que fez aquilo de sacanagem mesmo, e depois explicou que era uma corruptela para “Sarajevo” (capital da Bósnia e Herzegovina). O desgraçado se divertia com as cantadas que recebia no chat da rádio. Ah, sim, esclarecendo que o programa dele não tinha, e ainda não tem, locução.

Participamos por algum tempo naquela webradio, mas logo divergências com o dono fizeram com que eu, “Sara Evil” e alguns outros saíssemos. Foi quando tive a ideia de criar minha própria webradio, assim nascendo, em 2010, a KFK Webradio, com o slogan: “A Rádio Que Toca Ideias”. Além de música (Rock), eu colocava leituras de poesia, áudios de curiosidades do rádio, etc. Pittas e outros entraram nessa, e a rádio foi inovadora em muitas coisas, como tocar a obra completa de Richard Wagner, “O Anel do Nibelungo”, algo bem inusitado para uma “Rádio Rock”. Porém, a duração da KFK foi efêmera, acabando cerca de um ano depois.

Parti então para outros ares, participando de outras rádios e projetos, como sites, e sempre que podia trazia o Renato para perto, pois passei a conhecer melhor sua habilidade com as artes, tanto visuais quanto escritas ou sonorizadas. “Almoxerifado” (sim, escrito assim mesmo, em mais uma sacada sacana do Renato) passou a ser o programa dele, sempre com Rock Pesado e uma porção de inserções muito bem sacadas.

Arte Gerada com Auxílio de IA (Ideogram)

Mais que uma admiração – mútua, diga-se de passagem – percebi algo além das artes: o caráter do Renato, sempre uma pessoa muito correta em seus atos, e de um respeito total às diferenças e posturas. E com tudo isso, claro, a amizade cresceu mais e mais.

Em 2020, no auge da Pandemia, criei um site voltado especialmente para a Poesia, chamado “Bardo Poeta” e, claro, Renato lá estava com seus textos cheios de metáforas e figuras, escritos num estilo que muito me agradava – e ainda me agrada. Mais uma vez, por problemas de vaidades humanas, o site durou pouco, mas logo parti para outro projeto: “Agulha.xyz”, com uma visão mais ampla, focado mais na questão política, que na época se tornara uma fossa, algo que permanece até agora. Também lá estava meu querido amigo Pittas.

No final de 2021, devido a problemas pessoais, incluindo uma forte depressão (quem não se ferrou de um jeito na tal Infodemia se ferrou de outro), larguei tudo: o site, a escrita e tudo mais. Foram dois anos de completa letargia.

Em janeiro de 2024, resolvi voltar com tudo, reativei o Agulha e retomei minha escrita. Nesse ínterim, Renato sempre me mandava algumas artes feitas com auxílio de IA, e eu dizia “Ah, ok, mas isso é feito por máquina…”. Ele tentava me convencer de que não, que a IA era uma ferramenta como outra qualquer. Afinal, não tínhamos nós usado dicionários, enciclopédias e posteriormente o Google para nos auxiliar nas artes? Eu não me convencia.

Suas artes visuais passaram a ficar cada vez melhores e, embora eu soubesse de sua formação e talento para as artes gráficas, acreditava que era apenas evolução da tal Inteligência Artificial. Pacientemente, ele me explicava e dava exemplos de que não, que a IA só conseguia “produzir” algo se fosse total e absolutamente orientada, dirigida. Comecei a ceder e a ficar curioso com essa tal ferramenta, que eu via mais como uma arma (um osso de fêmur, a primeira ferramenta e possivelmente a primeira arma descoberta e usada pela humanidade).

Arte Gerada com Auxílio de IA (Leonardo AI)

Nesse ponto, já tinha sido convencido e passei a experimentar algumas coisas, como usar o ChatGPT para gerar tags para publicações do site Agulha. Essa é uma tarefa chata, irritante e dispendiosa em tempo, e como isso é lido por máquinas também, nada melhor que usar uma para tal feito. Afinal, a função das máquinas é essa mesmo.

Concomitante a isso, comecei a receber alguns contos e crônicas escritas pelo Renato Pittas, que me deixaram muito feliz, pois ele havia me dito que, depois de ler “A Arte de Escrever” de Arthur Schopenhauer, tinha definitivamente desistido de escrever. Compreensível, porque o Schopenhauer era extremamente radical com a escrita e cruel com os escritores. Os textos eram muito bem escritos, de uma forma e num estilo bem diferentes, embora mantivessem a essência do pensamento “Pittiano”.

Tudo ali era muito ele, mas tinha um polimento, digamos, mais cristalino e uma forma literária muito mais formal e fluida. Claro que me encantei com os textos e passei a publicá-los no Agulha. Isso foi em meados de maio de 2024, e até agora, no último dia de junho, foram exatamente 102 textos enviados e publicados. 100 são crônicas ou contos, e os outros dois são poesias.

E agora cá estamos, com uma antologia desses textos encantadores, que também demonstram que a IA pode ser uma ótima ferramenta de auxílio à criação, como um pincel que é apenas uma ferramenta na mão de um pintor, uma máquina de escrever na mão de um escritor, ou mesmo qualquer outra máquina ou artefato que possa encurtar distâncias, facilitar e até mesmo ensejar maior qualidade no trabalho de um artista.

Claro que, como um fêmur humano pode ser usado como arma, mas a culpa e o problema não estão na ferramenta, mas em seu uso. O mesmo vale para um garfo, que foi descoberto ou inventado para nosso conforto e progresso, mas que pode ter usos criminosos.

Espero mesmo que a humanidade possa usar esse “Fêmur Tecnológico” como sua melhor e mais avançada descoberta, capaz de criar belezas, curas, melhorias sociais e, enfim, para o bem. E não para destroçar o crânio de um oponente.

Barata Cichetto, Araraquara, SP, 01 de Julho de 2024

Tagarelices: Conversas Fiadas Com as IAs
Renato Pittas
Contos, Crônicas
296 Páginas
20 x 20 x 1,6 cm
UICLAP, 2024

Barata Cichetto, Araraquara – SP, é o Criador e Editor do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador

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