Atualizado em 16/01/2025 as 18:26:08
Entre os quadrinhos nacionais, o trabalho de Eduardo Schloesser é um monumento de resistência e criatividade. Seu personagem mais icônico, Zé Gatão, transcende o gênero ao misturar violência, erotismo e existencialismo em narrativas densas e visualmente impactantes. Criado em um contexto de dificuldades financeiras e uma atmosfera de depressão pessoal, o universo de Zé Gatão reflete as sombras de seu criador e as luzes de sua genialidade. A figura do felino antropomórfico é um símbolo do isolamento e da luta contra as adversidades, temas que ressoam profundamente com quem entra em contato com suas histórias. Zé Gatão nasceu oficialmente em 1992, mas seu embrião remonta ao final dos anos 80, quando Schloesser experimentava com estampas e ilustrava histórias em quadrinhos em meio ao caos urbano de São Paulo. Ao longo de sua carreira, Schloesser construiu uma obra que atravessou barreiras gêneras, estéticas e ideológicas, desafiando as limitações impostas pelo mercado editorial brasileiro.
As Camadas da Obra de Schloesser
A obra de Schloesser é rica em detalhes. Seus desenhos à grafite são meticulosamente trabalhados, com uma atenção quase obsessiva a cada sombra e traço. É uma arte que convida à contemplação prolongada, como testemunhou Barata Cichetto ao descrever seu primeiro contato com A Vida e os Amores de Edgar Allan Poe. A habilidade de Schloesser em capturar a essência de Poe através de suas ilustrações é um testemunho de seu talento inigualável. Para além dos traços, as histórias de Zé Gatão são marcadas por um profundo humanismo, ainda que filtrado por um prisma de brutalidade e erotismo.
Os temas abordados nas histórias vão além da violência física. Eles exploram as violências psicológicas e sociais, as quais Schloesser vivenciou durante sua carreira. O preconceito enfrentado por criar narrativas fora do padrão comercial também ecoa nos desafios de Zé Gatão, um protagonista solitário que reflete o próprio criador.
Luca Fiuza e o ZéGatãoVerso
Se Schloesser construiu o alicerce desse universo, foi Luca Fiuza quem expandiu suas possibilidades narrativas. Os contos de Fiuza sobre o Zé Gatão são uma prova de como um personagem pode transcender o controle de seu criador e inspirar outros artistas. Barata Cichetto, em um de seus muitos projetos editoriais, reconheceu esse potencial ao republicar os contos de Fiuza em seu portal BarataVerso, posteriormente levando-os para uma edição impressa.
Os textos de Fiuza capturam a essência do universo criado por Schloesser, adicionando camadas de profundidade psicológica e aventuras que expandem as narrativas originais. Sua escrita é marcada por um apuro estético que reflete o mesmo amor pelos detalhes encontrado nos desenhos de Schloesser. As histórias mantêm o tom sombrio e visceral, enquanto exploram novos territórios do ZéGatãoVerso.
Barata Cichetto: O Editor Incansável
Barata Cichetto desempenha um papel fundamental na preservação e expansão do legado de Zé Gatão. Seu trabalho como editor vai além do simples ato de publicar. Ele é um mediador cultural, conectando artistas e obras com um público que, muitas vezes, não teria acesso a essas criações. Foi por meio de seu portal e de sua nova iniciativa editorial, a BarataVerso Editora, que o ZéGatãoVerso ganhou vida em formato impresso.
A dedicação de Cichetto à difusão da cultura underground é notável. Ele não apenas publica, mas também promove, comenta e contextualiza as obras que edita. Sua habilidade em identificar talentos e reconhecer o valor de projetos fora do mainstream é um trunfo raro no mercado editorial brasileiro. No caso de Zé Gatão, ele não apenas trouxe visibilidade ao trabalho de Schloesser, mas também conectou-o a novos colaboradores, como Luca Fiuza.
Conclusão
O universo de Zé Gatão é um testemunho da resistência e da criatividade de artistas que desafiam as limitações do mercado e as convenções narrativas. Eduardo Schloesser construiu uma obra que é, ao mesmo tempo, profundamente pessoal e universal. Luca Fiuza ampliou essa narrativa com contos que capturam a essência do personagem enquanto exploram novas possibilidades. Barata Cichetto, por sua vez, desempenhou o papel de curador e editor, garantindo que essas histórias alcançassem um público mais amplo.
Juntos, esses três criadores provam que a arte é uma força viva, capaz de atravessar barreiras e inspirar novas gerações. O ZéGatãoVerso não é apenas uma coleção de histórias; é um testemunho do poder da colaboração e da dedicação em manter viva a chama da cultura alternativa.
Santo Xavier, Lisboa, 2025
Santo Xavier: Antônio de Santo Xavier nasceu em 22 de Fevereiro de 1963, numa casa simples do bairro do Tatuapé, zona leste de São Paulo. Quando ainda muito pequeno, seus pais, Frederico e Santa Xavier, oriundos de uma família tradicional paulistana, perceberam que o garoto não era burro ou simplesmente desatento, mas completa e totalmente surdo e mudo. Considerando a situação vergonhosa, resolveram abandoná-lo num orfanato, onde nunca o visitaram. Santo cresceu e, mesmo diante de suas deficiências, aprendeu a ler e a escrever, tornando-se um voraz leitor de clássicos literários e, posteriormente, um escritor bem-sucedido, especialmente de contos autobiográficos, que são sucessos literários em todo o mundo lusófono. Atualmente, Santo mora em Lisboa, no Largo de São Carlos, em frente ao Real Teatro de São Carlos, no centro da cidade. Politicamente, inspira-se em Salvador Dalí e se define como anarquista-monarquista.
ZéGatãoVerso – Contos de Luca Fiuza Ilustrados por Eduardo Schloesser
Texto: Luca Fiuza
Criação do Personagem e Ilustrações: Eduardo Schloesser
Apresentação e Edição: Barata Cichetto
Gênero: Contos/Quadrinhos
Ano: 2024
Edição: 2ª
Editora: BarataVerso
Páginas: 312
Tamanho: 16 × 23 × 1,80 cm
Peso: 0,500
O Santo Xavier conseguiu neste texto – absurdamente bem escrito, por sinal – esmiuçar o universo criado pelo Schloesser de maneira muito clara e entender o personagem como ninguém. Palmas para ele!
Extremamente lisonjjeado com tais palavras! Incrível como você conseguiu compreender minhas intenções ao criar esse universo antropozoomorfo e discernir o protagonista.
Muita gratidão e parabéns pelo texto muitíssimo bem escrito!
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A resenha do Antônio resume de forma magistral não só a obra ZéGatãoVerso, mas também todo o universo do personagem assim como a saga das pessoas envolvidas nessa monumental coalizão de talentos.
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