Atualizado em: 02/11/2024, as 01:11
Quais são as primeiras coisas que um homem diz a uma mulher quando se interessa por ela? Existem variações, mas, via de regra, são palavras relacionadas a amor, paixão, desejo. Frases como “eu te amo”, “estou louco por você” ou “quero transar contigo”. Mas não eu, claro. Embora até tenha pensado em algo assim, a primeira coisa que disse foi: “Eu sou chato! Chato pra caralho!”, “Eu sempre falo a verdade, até quando estou mentindo” e… “Me dá o cu?”. (Não, nessa eu fui desonesto, porque a terceira sempre foi: “me leia para me entender”). E era sempre assim, nessa mesma ordem, parecendo a semântica obscura de um adolescente. Mas, como nunca deixei de ser, mesmo antes e depois de ser, um adolescente antecipado ou tardio: chatice, verdades e poesias sempre me definiram. Afinal, o que é ser honesto sem ser chato? O que é ser verdadeiro sem ser um chato? E como ser poeta sem ser… chato?
Não sei o que fui primeiro na minha vida: chato, poeta ou verdadeiro. Acho que veio tudo junto, naquela gota de espermatozoide chato que entrou num útero poético com um ardil verdadeiro, ou em outra ordem adjetiva ou subjetiva.
Lembro perfeitamente da minha primeira atitude que ilustra com louvor minha tríade hegemônica definitiva. Por volta dos dez ou doze anos, gritei com minha mãe, depois que ela me disse que me conhecia melhor do que ninguém por ter me carregado na barriga por nove meses: “A senhora não me conhece mais do que eu a conheço, afinal, eu sei de cor as suas tripas, vísceras e intestinos. Enfim, nunca esteve dentro de mim, mas eu estive dentro de si”. Querem coisa mais poética? Querem coisa mais verdadeira? Querem coisa mais… chata?
Chega a doer, porque ser chato, poeta e verdadeiro são coisas que ninguém escolhe. Está lá dentro da porcaria do espermatozoide e do útero, uma carga hereditária alimentada por uma cadeia genética, ou, para quem preferir, espiritual. Ninguém acorda de manhã e diz: “A partir de agora, serei chato”. Ou: “Hoje acordei poeta e assim serei”… Ou ainda: “Hoje acordei sendo verdadeiro”. A verdade não “está lá fora”, mas intrinsecamente guardada dentro de cada átomo de um ser.
Sempre me pergunto se eu seria uma dessas coisas sem ser a outra. Seria eu o poeta que sou sem ser verdadeiro? Seria eu verdadeiro sem ser chato? Seria eu o chato que sou sem ser poeta? Ah, essa terceira opção é a única que me soa verdadeira, embora chata. Enfim, todos os verdadeiros são chatos, mas nem todos os chatos são verdadeiros. Todos os poetas são chatos, e nem todos os chatos são poetas. Toda a recíproca é verdadeira, mas nem toda a verdade é recíproca.
E agora a pergunta de um milhão: é bom ser chato, poeta e verdadeiro? Eu respondo fácil: ser poeta é chato, mas ser verdadeiro é a única poesia que conheço!
12/10/2024
Barata Cichetto, Araraquara – SP, é o Criador e Editor do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador.