Atualizado em 28/07/2024 as 11:33:14
Karl Stockhausen (isto há 60 anos) quis ouvir a som de sua música refletida nas paredes da cidade sagrada de Petra, embutida numa caverna no meio do deserto oriental. Levou lá sua maquinaria eletroacústica e uma orquestra de câmara, gravou e aconteceu como o Pink Floyd em Pompéia nos anos 70. Tocaram para os elementos, tirando sua inspiração das rochas, dos espíritos do fogo, do sol e do vento.
A arte eletrônica tomou a forma definitiva pós criação de Robert Moog, dos sintetizadores analógicos entre 1967 e 1968. Incorporando os aspectos metafísicos de Stockhausen, as bandas mais ousadas do rock, cito nas áreas do progressivo, eletrônico kraut alemão e experimentais ácidas, lançaram então uma nova maneira de se fazer, compor e ouvir o mesmo.
Klaus Schulze e Ash Ra Temple seguidos pelo Pink Floyd acabam gerando seus filhotes (incluindo eu) por todo Planeta. Tangerine Dream, Kitaro, Vangelis, Jean Michel Jarre, Richard Pinhas, Tim Blake, Neuronium e o próprio Schulze, criam enormes e fantásticas discografias, experimentos, novidades inusitadas aos ouvidos acostumados ao primitivo 3 acordes do rock básico.
Provém daí as bandas progressivas com suas tecladeiras enormes, mellotrons, hammonds, arp strings, pianos elétricos e toda uma gama extremamente versátil de sintetizadores. O rock se torna galante, profundo, sinfônico, pomposo, extremo, revolucionário cada vez mais. Gênesis, Yes, King Crimson, EL&P, Triunvirat, Gentle Giant, Le Orme, PFM, Van Der Graaf Generator, Jethro Tull, entre outras milhares, incorporam as entranhas dos grandes Mestres do passado e acabam por fazer a fusão definitiva do rock ao erudito.
O eletrônico se torna vasto. Brian Eno, um maluco experimentalista (deixou sua marca no Roxy Music) acaba influindo em toda uma variedade de músicos, e possui hoje uma vasta discografia, junto com Schulze, Tangerine Dream, Hawkwind, etc., da qual se pode extrair infinitas audições e viagens alucinantes.
A mensagem inicial de Stockhausen passa pelo Zen Budismo, o Taoísmo, a extrafísica piramidal cósmica. Penetra nas temáticas e experimentos agudos com a máquina de fazer sonhos, o sintetizador. As obras se tornam cada dia mais densas e incorporadas a uma temática universal, além das galáxias e das estrelas. As discografias se tornam monstruosas, cada qual com mais de 100 discos editados. Quantidade e qualidade lado a lado.
Chegando a 2014, muitas ainda sobrevivem e fazem de sua música e arte uma ode aos iniciados, os poucos que sobreviveram dos grandes períodos de 60 e 70. Os ouvidos estão surdos, a maior parte do Planeta, apesar de uma grande evolução na informação e tecnologia, mergulha no medíocre, no lixo. Agora seria a Grande Era dos Sintetizadores, desta música eclodir, diriam os desavisados. Mas meia dúzia de grandes homens criou a tecnologia e um bando de macacos primitivos faz uso negativo de suas potencialidades. A mídia descobriu a máquina de fazer idiotas. Os idiotas ensinam novos idiotas a ouvir e consumir a arte dos imbecis.
E todo este magnífico sonho de Stockhausen desaba num abismo cruel e ilimitado, sonhado por poucos, curtido por homens que não decaíram no miasma fedorento planetário.
Mas arte, a verdadeira arte, ainda vive, e respira, mesmo que seja no centro ilimitado de fogo e carne queimada, no abismo luciferiano daqueles que ainda ousam gritar e ouvir o eco do abismo.
Texto Publicado na 2ª edição da Revista “Gatos & Alfaces“, Março, 2014
Amyr Cantúsio Jr. – Campinas, SP. Músico, Compositor, Pianista, Produtor e Gestor Cultural, Técnico em Fortran & Cobol, Musicoterapeuta em Neurociencia. Livre Pensador.