Atualizado em 07/11/2024 as 23:58:08
A música é uma das mais antigas formas de manifestação do espírito livre do ser humano. E como qualquer outra espécie de arte, surgiu pela necessidade natural de expressão de sentimentos. É possível que ela, a Música, tenha surgido juntamente com a própria capacidade de expressão verbal, desenvolvida por nossos ancestrais. É bem possível que tenhamos começado a cantar até antes de falar. Observe uma criança bem pequena, que antes de aprender a falar emite sons que parecem muito com notas musicais naturais.
Sendo assim, algo desenvolvido naturalmente pela humanidade, como necessidade de expressão, a música é a mais profunda representação da mais orgânica das nossas necessidades, que a liberdade, e portanto, qualquer tentativa de cerceá-la, censurá-la, puni-la, deve ser tratada como um crime contra a humanidade, no seu mais íntimo e absoluto sentido, e sendo assim, deve ser rechaçada e escorraçada.
Já foi dito que a Música é a Arte das artes, pois pode ela retratar a todas as outras, e sendo assim, ela é a mais nobre e impoluta, e não deve nunca deixar seu ideal de nobreza ser usurpado por tiranos de qualquer espécie. A Música trata da poesia, da literatura, cria o ritmo da emoção no cinema, acompanha todos os momentos do ser humano, do nascimento até a morte. Da cantiga de ninar à marcha nupcial à marcha fúnebre. Todos, quase que sem exceção neste planeta têm a Música como companheira de toda sua existência. alguém pode não gostar de um determinado ritmo ou estilo, mas de alguma forma de música, certamente aprecia. A Música conta histórias humanas, registram momentos históricos, retratam existências, experiências e lutas. Falam do bem, falam do mal, do bom e do mau. Sempre foi assim, e assim precisa continuar a ser, sob pena de perdermos totalmente o sentido de humanos.
A Música, como qualquer expressão artística não pode ser levada à qualquer condição coletivista, seja pela forma como pelo conteúdo, pois toda Arte é uma criação individual, mesmo que o resultado seja coletivo. Não existe Arte coletiva, e ponto final.
Acontece, que neste ainda início de século XXI, terceira década do terceiro milênio, uma parcela enorme de pessoas, decidiram que a música precisa retratar apenas o que julgam correto. E esse julgamento sumário, baseado numa correção que nada tem a ver com justiça e humanidade, mas em lavagem cerebral perpetrada em escolas marxistas, que pretendem levar a humanidade a um coletivo sem cérebro e sem rosto, tem feito suas vítimas.
Uma das mais recentes “vítimas” (E uso essa palavra entre aspas, uma meia dúzia delas, pelo sentido que os coletivistas politicamente corretos, braços armados do marximo-gramscismo cultural, faz dela), é o músico paulista Yuri Fulone, um multi-instrumentista que em 2019 lançou um disco conceitual que conta a história do Bandeirante Fernão Dias Paes. Bastou o tema, para a horda vermelha cor de sangue tecesse as mais inescrupulosas ofensas ao trabalho, feito com muito afinco e dedicação, além de profissionalismo extremos, por Yuri e seus parceiros de disco e banda. O “ódio do bem”, que deve ter saído de alguma cartilha de Josif Stalin ou de Che Guevara, figuras que representam o que de pior existe na humanidade, foi lançado sobre o “Fernão Dias Paes”, não apenas a obra musical, quanto à figura histórica das Bandeira, ignorando o legado e o trabalho feito por cada um. Não fossem as bandeiras, o Brasil certamente seria um país menor que o Chile, em território.
Claro que existiram erros e excessos, mas há que se lembrar do momento e contexto histórico. Condenar alguém sob a luz da realidade social e moral do século XXI, desprezando tal contexto é no mínimo desonestidade. Da mesma forma que justificar. Acontece que para as pessoas que “cancelam” trabalhos como o de Yuri Fulone, sob a alegação de tratar do “opressor” não do “oprimido” (aspas, sempre aspas), mesmo que não haja na obra qualquer espécie de julgamento ou adjetivação, são as mesmas pessoas a justificar criminosos como Stalin, Che, Fidel e outros. São pesos medidas totalmente diferentes. São pessoas que pregam que os portugueses, em muito menor número, e armados de fugazes arcabuzes, e sem conhecer o território, dizimaram completamente os índios.
“Fernão Dias Paes”, a obra musical conta de uma forma emocionante sem ser emocional, a história de Fernam Diaz Paes, como era grafado originalmente em documentos da época, nascido na “Vila de São Paulo dos Campos de Piratininga”, nome da cidade de São Paulo à época, que em 1674 liderou uma expedição que durou sete anos para o norte composta por 600 homens, em busca da lendária “Lagoa das Esmeraldas”.
E é assim, na narração do ator Isaac Bardavid, que o disco abre, seguido da épica “O Bandeirante”, cantada por Nuno Monteiro, vocalista da banda Liar Symphony, que sem os exageros agudos comuns no gênero, e uma voz firme e segura, começa a contar a história da Bandeira de Fernão Dias. “Alguns companheiros preferem fugir, mas sou Fernão Dias, não vou desistir”, diz um trecho da letra, que já deixa clara a intenção do Bandeirante em encontrar as tão sonhadas esmeraldas.
O disco segue, com a competente banda liderada por Fulone – Pedro Esteves, nas guitarras, Anderson Alarça na bateria, e o próprio Yuri nos teclados, baixo, violão e viola, levando a faixa “Donos da Terra”, onde é contado o enfrentamento com tribos de índios que queriam barrar seu objetivo. A música forte, pesada, com levada Metal, emoldura a letra pungente, que em determinado trecho diz: “Bravos índios,respeitamos sua coragem, mas tenho uma missão, e farei tudo o que puder… Vamos passar”. A narração a seguir narra o encontro com os guerreiros Mapaxós, “que os atacam na tentativa de impedir que a Bandeira cruzasse seu território”.
A faixa a seguir, cantada por Nayara Camazorano, é de uma beleza e singeleza ímpares, narrando a angústia da espera de Maria Garcia Betim, esposa de Fernão. Não tem como não se emocionar com doce voz de Nayara, especialmente quando a vemos como a mulher forte de um homem forte, que ela pressente jamais tornará a ver.
A quinta faixa, “Traidor”, é um preâmbulo em forma de narração feita pelo ator Bardavid, do que é, em minha opinião o ponto alto do disco, o tema “o Enforcado”, que fala sobre Fernão ter descoberto que um de seus filhos, de nome José Dias tramava sua morte, e por conseguinte o condena a forca. A música é poderosa, forte, um tema Metal Rock que conduz a emoção causada pela traição e a condenação e, sente-se toda a carga emocional do fato, com a voz de Nuno carregando nas tintas escuras, e nos levando a sentir toda a dor. “Siga para aquela corda, não há perdão para lhe tirar daqui. Enforcado. Enforcado.”
A penúltima faixa, “As Esmeraldas”, conta o que teria sido, finalmente, depois de tanto sofrimento, o encontro da tal Lagoa das Esmeraldas, já com o Bandeirante ardendo em febre, por conta da malária. A musica é mais branda, sem perder o peso, como numa espécie de Réquiem, e termina angustiante, com “As esmeraldas do Rei, as esmeraldas da morte.”
O disco encerra com mais uma narração, que conta uma história que já é conhecida por quem estudou um mínimo de história do Brasil – ao menos em épocas pré-paulofrieirianas -, de que na verdade, Fernão Dias Paes morreu acreditando ter encontrado suas sonhadas esmeraldas, quando eram apenas turmalinas, pedras sem valor. Por fim, conta sobre o legado da Bandeira, abrindo caminhos e descobrindo o ouro de Minas Gerais, que mais tarde deflagraria a maior corrida do ouro da história.
E não podemos deixar de também enaltecer a faixa bônus, “Raposo Tavares”, que conta brevemente a história de outro grande Bandeirante. Estaria Yuri Fulone preparando outro épico Metal, a contar outra história? Aguardemos.
Em resumo, acima de qualquer julgamento sobre o personagem retratado, é preciso louvar, e muito, o trabalho de Yuri Fulone, que decidiu, depois de três trabalhos em inglês, tratando de temas um tanto distantes da nossa realidade, contar, em bom português um trecho da história do Brasil, mesmo sabendo o risco de apedrejamento que iria sofrer ao escolher o tema.
E eu fico aqui traçando um paralelo com outras bandas e artistas, como Iron Maiden, que sempre retrata fatos e personagens históricos, como Churchill, Alexandre o Grande e outros, ou a sueca Sabaton, que em seus discos trata basicamente de heróis de guerra, batalhas etc.. Aliás, no disco “Heroes”, de 2014, a banda gravou “Smoking Snakes”, contando a história de três pracinhas da FEB, que morreram heroicamente em confronto com os nazistas, no final da segunda guerra mundial, com direito a um refrão cantado em português com sotaque sueco: “Cobras Fumantes, eterna é sua vitória”. Essa musica tem sido executada por varias corporações musicais ligadas ao Exército Brasileiro. No Brasil, prefere-se falar de “vítimas” (as aspas necessárias) em lugar de Heróis (sem aspas). Movimentos ligados – sempre à “esquerda” (aspas, aspas, aspas) querem destruir estátuas de Bandeirantes e retirar seus nomes de grandes rodovias, como a que leva o nome de Fernão, ligando a Grande São Paulo a Grande Belo Horizonte, e possivelmente colocar em seu lugar alguma “vítima” da sociedade.
Escrito por Barata Cichetto, um paulista e paulistano, e como tal de certa forma orgulhoso descendente indireto de todos os Bandeirantes, que usa chapéu e fuma cigarro de palha, na madrugada de 7 para 8 de Janeiro de 2021, num mundo onde todas as distopias se encontraram e criaram um cenário de ódio e desumanidade, e quando a Arte é humilhada e prostituída por ideologias mentirosas e criminosas que visam, entre outras coisas, apagar a história para que sua própria versão dos fatos prevaleça. E quando o Rock e todo o seu Multiverso tem seu legado rasgado e destruído, se opondo justamente ao seu propósito inicial. Uma sociedade asséptica e extremamente doente que sucumbe ao mais cruel dos vírus, que é o medo, coisa que Fernão Diaz Paes jamais conheceu. “Viva Fernão Dias Paes, o Caçador de Esmeraldas”.
Fernão Dias Paes
Yuri Fulone
2019
Formato: CD
Gravado no Estúdio Masterpiece
Produção: Pedro Esteves
Músicos:
Nuno Monteiro: Vocal
Nayara Camarozano: Vocal em “1674” e “Quando Voltarás”
Pedro Esteves: Guitarra, Backing Vocals
Anderson Alarça: Bateria
Yuri Fulone: Teclado, Baixo, Violão, Viola
Isaac Bardavid: Narração
Faixas
1. 1674
2. O Bandeirante
3. Donos Desta Terra
4. Quando Voltarás
5. Traidor
6. O Enforcado
7. As Esmeraldas
8. Final
9. Raposo Tavares (Faixa Bônus)
Discografia de Yuri Fulone:
When the Sky Meets the Earth (2014)
The Blacksmith EP (2014)
In the Steel You Can Trust EP (2016)
Your Kingdom Will Fall (2017)
Fernão Dias Paes (2019)
Descobridores (2024)
Links Relacionados:
https://www.facebook.com/yuri.fulone
Barata Cichetto, Araraquara – SP, é o Criador e Editor do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador.
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