Atualizado em: 07/11/2024, as 01:11
Queridos amigos, recentemente recebi alguns questionamentos referente a transferência dos direitos autorais, no entanto, dentre as indagações constatei uma preocupação recorrente no caso ex-mulheres ou ex-maridos virem a se locupletar dos direitos autorais das obras intelectuaisem processos de divórcio.
Como já disse em outra matéria, com o falecimento do autor, inevitavelmente os direitos autorais sobre a obra serão inventariados em favor dos herdeiros habilitados, sendo certo que, os herdeiros receberão exatamente aqueles direitos que o autor detinha antes de morrer, só que nesse caso os herdeiros os recebem como “titulares”, isto é, jamais se transformarão em “autores” das obras.
Vamos ilustrar, à título de exemplo, no caso de um autor que falece e deixa cônjuge e filhos, e era casado em regime parcial de comunhão de bens, no inventário a partilha ficará da seguinte maneira: o cônjuge ficará com 50% dos bens, enquanto os filhos com o restante divididos em partes iguais entre eles.
No entanto, essa comunicabilidade não ocorre desta mesma maneira na partilha entre vivos, como ocorrem com os demais bens e direitos em caso de divórcios de casal.
De imediato, destaco que tanto os direitos autorais como a autoria da obra intelectual, de tão importantes, receberam proteção especial em nossa Constituição Federal de 1988, ou seja:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(. . .)
XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;”
No mesmo sentido, a Lei dos Direitos Autorais (Lei 9610/98) também destinou proteção especial ao autor da obra, através de seu artigo 39, ou seja:
“Art. 39. Os direitos patrimoniais do autor, excetuados os rendimentos resultantes de sua exploração, não se comunicam, salvo pacto antenupcial em contrário.”
No entanto, qual a conclusão podemos tirar diante desta suposta incomunicabilidade disposta no artigo 39 da Lei 9610/98?
Em primeiro lugar, temos que, se as partes na celebração do casamento, realizarem pacto antenupcial tratando que os direitos patrimoniais do autor da obra intelectual serão considerados comunicáveis, elas se comunicarão no momento do divórcio e partilha de bens e fim de papo, por outro lado, não havendo o pacto, o direito será incomunicável.
Evidentemente, tenho que destacar que os direitos autorais estão em constante discussão e evolução em nosso país, haja vista que a lei possui apenas pouco mais de 20 anos, razão pela qual, essa incomunicabilidade também encontra-se em plena discussão, existindo uma pequena gama de doutrinadores e juízes que divergem desta regra de comunicabilidade.
Mas, em via de regra a incomunicabilidade disposta no artigo 39 vem sendo o entendimento aplicado ao caso.
Por outro lado, torna-se importante destacar que a obra intelectual possui conteúdo patrimonial e moral, como já abordamos amplamente em outras matérias.
Assim, temos sempre que a característica moral da obra é aquela inalienável, irrenunciável e intransmissível, possuindo caráter personalíssimo.
Por sua vez, a dimensão patrimonial da obra é aquela que pode ser alienada, no entanto, segundo nossa doutrina e jurisprudência dominante, os direitos patrimoniais incidentes sobre a obra intelectual são incomunicáveis na partilha entre vivos, no caso de não existir paco antenupcial dispondo o contrário, que é exatamente o que diz o citado artigo 39 da lei dos Direitos Autorais.
Ademais, para que não restem dúvidas, quando o artigo 39 da lei menciona “excetuados os rendimentos resultantes de sua exploração”, ou seja, fazendo entender que os rendimentos resultantes da sua exploração são comunicáveis, na verdade o que temos é que, se durante a vigência do casamento percebeu-se proventos decorrentes daquela obra intelectual, evidentemente estes passam a integrar o patrimônio do casal, seja em espécie, seja por meio da aquisição de outros bens, portanto entrarão na partilha do casal em caso de divórcio.
Em suma, não há comunhão quanto aos direitos, mas apenas quanto aos rendimentos que esses produziram durante a constância do casamento.
Por fim, muito diferente das correntes que defendem teses opostas, reforço que a incomunicabilidade prevista na lei 9610/98 em nenhum momento conflita com as disposições legais de regime de bens e partilhas dispostos no Código Civil, mesmo porque seu artigo 1.659 prevê a exclusão dos proventos decorrentes do trabalho pessoal de cada cônjuge da comunhão, logo, claramente podemos entender como proventos do autor os direitos patrimoniais decorrentes de sua obra. Vejamos o que diz o Código Civil:
“Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
(. . .)
VI – os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;”
Ademais, além de não conflitar com o Código Civil, no que tange a comunhão dos bens, a incomunicabilidade nem mesmo desrespeita os princípios constitucionais da igualdade e da pessoa humana, mesmo porque, a obra intelectual também mereceu a proteção constitucional como expliquei logo acima.
Portanto, para que ocorra a comunicabilidade dos direitos patrimoniais da obra autoral no caso de partilha entre vivos, como por exemplo em processo de divórcio, torna-se indispensável a existência de pacto antenupcial anterior prevendo essa situação, caso contrário não será objeto de partilha.