Atualizado em: 30/10/2024, as 11:10
Que dia é hoje? Pensei quando acordei. Eram dez e meia da manhã e fui ao banheiro, escovei os dentes, caguei e fui fazer café. Não lembro se a ordem foi essa, mas foi essa, a ordem e uma ordem não se discute, se cumpre. Ordem do dia, pregada na parede do meu cérebro que não aguenta tanta ordem: Precisa de caos e desordem. Dia de não fazer nada! Como assim? Perguntei a ele, que se enrolou dentro da minha caixa craniana e voltou a dormir. Responde, vagabundo! E ele nada. Ficou ali quieto, sem dar um suspiro. Morreu, filhodaputa? E nada. Como assim, dia de descansar? Responde, seu arrombado! Uma mosca podia ser ouvida, mas nada daquele infeliz dar um pio. Então pensei: vai se foder, seu órgão escroto e cheio de manias, vou fazer o que quero e você que se foda! Mas… O que era mesmo para eu fazer? Ah… Bom, eu já tinha cagado, escovado os dentes, feito café… E o que mais? Tentei lembrar… Ô seu filhodaputa, acorda aí e me ajuda a lembrar o que tenho que fazer, disse eu ao desgraçado que dormia! Acorda maldito! Preciso de ti, compadre! Nada! Silêncio mortal! Sentei na minha confortável cadeira e apertei, naqueles gestos automáticos, o botão Power do computador. Pediu a senha… Que merda é essa senha? Bati na mesa porque não tinha a menor noção de qual senha era. Aliás, o que é mesmo senha? Soquei o teclado, dei um monte de socos na cabeça para ver se aquele desgranhento de uma figa acordava e me dizia qual era a tal senha. Nada, a não ser uma puta dor de cabeça. Acabei desistindo e fui para a rua. Comecei a andar sem ter a menor noção de onde estava e para onde ia. Andei. Apenas andei e nem sabia ler as placas das ruas. Dei com a cara em postes umas dez vezes. Uma garota passou, e era linda e sensual, pernas enormes, lisas e limpas… Pensei que tinha que sentir algo. Dei outro soco na cabeça. Gritei: Maldito, o que faço agora? Como antes, nenhuma resposta. A garota me olhou, passou por mim e jogou as ancas e os cabelos um para cada lado e seguiu em frente. Fiquei parado feito um cachorro que correu atrás de um carro que parou depois de um quarteirão… E a única coisa que pensei foi: que horas são? Senti umas coisas esquisitas na barriga, devia ser fome, hora de almoço talvez. Dei um ou dois tapas na barriga e outra porrada na cabeça. Essa doeu de fato. Acho que preciso voltar para casa. É isso? Não sei… Casa… O que é isso? Onde fica? Como se tem, faz ou entra? Acorda, maldito! Nada. Tinha um mendigo na esquina. Perguntei a ele sobre mim, se ele me conhecia. Disse que não. A puta e o cafetão disseram que tinham a solução. Acatei. E depois de uma foda e uma maconha que me deu dor de estômago, consegui dormir. Acordei. Dia seguinte, ou talvez um século depois. Eram dez e meia da manhã de um dia que não sei, em um lugar que não conheço, e estou sozinho e nu. Tem algo no céu que não sei o que é, mas parece mesmo uma imagem de algo que um dia me foi familiar. Alguém consegue me dar o endereço onde deixei meu cérebro dormindo e nunca fui buscar?
15/03/2024
Do Livro:
Vômito de Metáforas
Barata Cichetto
Gênero: Crônicas Poéticas
Ano: 2024
Edição: 1ª
Editora: BarataVerso
Páginas: 248
Tamanho: 20 × 20 × 1,50 cm
Peso: 0,500
Barata Cichetto, Araraquara – SP, é o Criador e Editor do BarataVerso. Poeta e escritor, com mais de 30 livros publicados, também é artista multimídia e Filósofo de Pés Sujos. Um Livre Pensador.